quinta-feira, 28 de agosto de 2025

Museu Histórico-Militar de Almeida

Celebrando a Vitória, fotografia de Arnaldo Garcês. MHMA

O texto deve ser lido com esta música de fundo (clicar aqui). Perceberão porquê no último parágrafo.

Impressionam os artefactos militares inventados pelo Homem. O museu expõe réplicas e armas originais dos povos que passaram no território de Almeida, e miniaturas de soldadinhos a travarem batalhas, desde os Romanos e Lusitanos até à Primeira Grande Guerra Mundial. 

Foi assombrosa a criatividade humana, ao longo dos séculos, para inventar armas que provocaram mortes, mutilações e dores indizíveis nos inimigos. Os Lusitanos usaram sabres e falcatas de ferro, perfuravam intestinos de um só golpe. Os Romanos infligiram os mesmos ferimentos com gládios - povo tecnicamente mais evoluído,  inventou catapultas que lançavam projéteis, de mais de 20 kg, até 400 metros de distância, arrasavam aldeamentos, derrubavam muralhas e esmagavam, de uma só vez, dezenas de inimigos.

No cerco de Lisboa, utilizaram-se torres de assalto, de vinte e sete metros de altura, para ultrapassar os muros e portas da cidade. 

Fabricaram-se vários tipos de objetos, cortantes e contundentes:  lâminas compridas, gumes metálicos, afiados e reluzentes,  sofisticados e letais - decepavam mãos e pernas num abrir e fechar de olhos. Malhos deformavam cabeças. Morteiros portáteis, canhões e colubrinas (canhões mais compridos, pesados e potentes) afundavam navios. As baionetas - espingardas de lâmina na ponta do cano, preparadas para a luta corpo a corpo - espetavam o inimigo quando estava estendido no chão. Na Primeira Grande Guerra, as metralhadoras disparavam  dezenas de balas em poucos segundos - uma inovação que alvejava vários inimigos de uma só vez.

Objetos que se observam silenciosos nos museus militares do mundo, depois de terem cumprido a sua  tenebrosa missão.

Exigiam conhecimentos técnicos e científicos avançados para o fabrico, minuciosamente aplicados. Eram construídos com os melhores materiais do seu tempo: madeiras finas de cerejeira, metais resistentes, de bronze e ferro fundido. Tinham designs atraentes e o nome do fabricante delicadamente gravado na superfície metálica e polida da arma, a atestar a origem nas mais recomendadas oficinas do mundo. Produtos de luxo que alimentavam a ilusão de invencibilidade.

Apreciados em vitrinas de vidro e salas preparadas para receber confortavelmente os visitantes curiosos, fascinados pela História e pelo passado. Colocados em antigas masmorras, asfixiantes - transformadas atualmente em salas agradáveis, sem o sangue e o horror indescritível da realidade da guerra - revelando, apenas, a memória e os relatos de batalhas distantes.

Perturba constatar o engenho e a capacidade humana utilizados para conceber instrumentos destinados a promover a morte e a destruição do seu semelhante. Exibem-se armas utilizadas ao longo de 2000 anos de conflitos,  que  arrastaram os homens e as  famílias deste território - atualmente tão sonolento e procurado pelo sentimento de  tranquilidade  - para a guerra.  Algo inconcebível para quem nasceu no fim do século passado e viveu sempre em paz. A paz talvez seja uma exceção e não a regra.

O rei D. Manuel I ordenou o registo das 51 fortalezas na fronteira portuguesa, de Castro Marim a Caminha,  ao desenhador Duarte D'Armas - um documento ímpar que as representa no início do século XVI. As aldeias históricas têm placas, junto das muralhas, que  mostram como eram nessa época. Hoje,  encontram-se muito incompletas em relação ao que eram há 500 anos: cidadelas inexpugnáveis,  com torres, baluartes, fossos e muros duplos, dentro das quais viviam centenas de pessoas,  preparadas para resistir a longos cercos. Eram arquiteturas defensivas, típicas de sociedades em guerra constante. 

Almeida tinha uma torre no interior da muralha, que explodiu no dia 26 de agosto de 1810, quando o paiol foi atingido por uma bombarda do exército napoleónico, que a cercava. Houve centenas de mortos, a fortaleza foi destruída e ocupada pelos Franceses. Uma mortandade tremenda na pequena vila de camponeses e militares. Quantas lágrimas, quanto desespero! Inimagináveis, agora,  ao observarmos este local tão pacato.

Um mês antes, um exército de 6000 soldados franceses tinha-se deparado com uma coluna de 4000 soldados anglo-lusos,  que travava o seu avanço do outro lado da ponte do rio Côa. Uma enormidade de homens aos tiros, a matarem-se uns aos outros de cada uma das extremidades, nesta ponte solitária e silenciosa. 

Na sala da Primeira Grande Guerra encontra-se uma fotografia de Arnaldo Garcês, fotógrafo que registou o quotidiano dos soldados portugueses nas trincheiras. Imagem maravilhosa de um soldado a celebrar a vitória. Ouve-se,  na sala,  música de fundo de Edward Elgar, Nimrod: a guerra até parece entusiasmante quando se escutam obras-primas como esta. 



Aqui situava-se o castelo de Almeida, destruído em 26 de Agosto de 1810.

Representação do castelo no século XVI. Desenho de Duarte D'Armas 

Ponte sobre o rio Côa, local de uma célebre batalha entre o exército napoleónico e as tropas anglo-lusas, em Julho de 1810




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