domingo, 21 de fevereiro de 2010

Percurso do Bocage (Estarreja - Bioria)


















Estou novamente no concelho de Estarreja, junto do esteiro de Salreu, para realizar mais um dos percursos que percorrem o Baixo Vouga Lagunar, promovidos pela BIORIA.

Neste local, junto ao Centro de Interpretação, encontro placas que indicam três percursos pedestres e cicláveis: Salreu, Bocage e Rio Jardim. Vou realizar o do Bocage.

Começo a encontrar as placas interpretativas que me dão informações desta fauna e flora. O percurso é sempre plano e segue por um estradão de terra, que também serve de acesso aos terrenos agrícolas envolventes a carros e tractores. Hoje é Domingo, dia de caça. Ouço tiros esporádicos ao longe e mais à frente encontro uma séria de carros estacionados. Provavelmente são de caçadores. Ao longo do percurso, mais dois jeeps, uma mota e um ciclista (Vá lá!) passarão por mim.

Pergunto-me sempre por que razão é habitualmente mais fácil encontrar veículos motorizados e indivíduos aos tiros do que simples caminhantes? É muito mais barato caminhar do que ter uma espingarda ou andar de carro, porquê que o mais caro e o mais agressivo são mais frequentes?


Um pato bravo sai subitamente do caniçal ao meu lado e voa espavorido para longe. Várias cegonhas planam calmamente poucos metros acima de mim, parecem tão habituadas à presença humana que não se assustam. Só me apercebo que há muitas outras aves escondidas quando um tiro as espanta e, de repente, levantam voo do meio das ervas. Ouço diferentes cantos que não sei identificar, infelizmente, a que aves pertencem.

Apanho algum funcho que cresce nas bermas, é bom para fazer chã e sopa de feijão. Uns vitelos observam-me pachorrentamente, parecem iguais aos de uma figura que vi num dos painéis a explicar que, no Baixo Vouga Lagunar, há uma raça de vaca exclusiva daqui, a marinhoa, boa para carne e leite, e muito usada nos trabalhos desta região.

O percurso descreve um semi-circulo paralelo à linha de comboio. Tenho algumas dúvidas em relação ao trilho correcto quando surgem outras bifurcações com caminhos idênticos a este, tenho que regressar ao painel interpretativo anterior e observar novamente o mapa com mais atenção. Considero que depois de feito, o percurso é bastante fácil e que não existem dificuldades de orientação. É uma questão de estar atento. A primeira vez que se realiza pode levantar algumas dúvidas, mas creio que nas próximas isso já não acontecerá.

O percurso é linear e deverá ter, aproximadamente, quatro quilómetros. Distância calculada  pelo tempo que demorei (uma hora e meia, com muita calma), porque não encontrei nenhuma informação precisa da distância. Depois de terminado, para regressar ao ponto de partida, deve-se seguir pelo pequeno caminho alcatroado encostado, do lado poente, à linha da CP, cerca de quilómetro e meio. Neste regresso, encontro outros painéis interpretativos do Percurso do Rio Jardim que, julgo, cruza-se com este. Fico com vontade de regressar e de um dia poder fazer tudo isto de bicicleta.

Uma cegonha planando sobre mim
Uma cegonha planando sobre mim
Funcho



Vitelo Marinhoa?

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

Fim do Entrudo
























Ainda em relação ao Carnaval de Podence: Os fatos dos caretos não podem ser lavados, senão estragar-se-iam, sendo apenas arejados. São caros, o de um adulto pode custar 600 €. As sinetas dos chocalhos são falos. Há uma sexualidade implícita no menear das ancas e no bater dos chocalhos contra as mulheres.

Às mulheres de Podence só lhes era permitido sair à rua disfarçadas de Marafonas.

Na casa do Careto podem ser observados estes fatos e muito mais (entrar aqui).

Outra tradição é o Pregão Casamenteiro, na qual são realizados os “casamentos” da gente da aldeia. São permitidas e toleradas as alusões licenciosas e a crítica social. Os “casamentos”, pelo ridículo da situação, não significam um enamoramento verdadeiro entre os visados, são apenas um pretexto para troçar dos diversos assuntos locais. Claro que para um forasteiro, descontextualizado dos assuntos da terra, será difícil entender os comentários. No entanto, toda a forma como se desenrolam suscita interesse: fazem-se de noite, na escadaria da igreja, com os archotes acesos para dar mais ambiência ao espectáculo. Os rapazes dão umas gargalhadas agudas de escárnio no fim de cada pregão, tornando o espectáculo mais diabólico e sinistro.

Que se tornou ainda mais diabólico e sinistro quando a iluminação pública se apagou, ficando a aldeia completamente às escuras. O público que assistia ao espectáculo acendeu archotes e colocou máscaras de diabo na cara. Começou-se a sentir o cheiro da cera queimada, todos pareciam espectros diabólicos com tochas a arder, seguindo o som dos tambores pela rua principal da aldeia até à casa do careto, onde continuou a haver espectáculo com mais malabarismos de fogo, sons e personagens do outro mundo através do teatro de rua da Mandrágora.


E não podia haver um grupo musical com nome mais apropriado para terminar a noite, “Os Roncos do Diabo”, quatro gaitas-de-foles e um tambor a marcar o ritmo até ao fim da festa.

Caminho até ao carro ouvindo ainda o eco dos Roncos. A neve teima em não cair, apesar do frio cerrado da noite. Não se vê ninguém, apenas alguns carros estacionados na berma da estrada. Regresso à residencial e no meio da noite, encadeados pela luz dos faróis, uns esporádicos flocos de neve serpenteiam no ar. Vou-me lembrando de histórias do diabo e de superstições antigas, pensando que se tivesse de caminhar sozinho, neste frio e escuridão, teria medo.


Nas barraquinhas encontram-se sempre produtos tradicionais da região, o azeite é um deles e um dos seus ex-libris. O Melhor do Mundo – foi o título atribuído a uma marca produzida aqui perto, na aldeia de Romeu de Jerusalém. No dia seguinte de manhã, observo que o azeite coalhou com o frio. Um sinal evidente de autenticidade. É na barraca do Solar dos Cortiços, compro quatro garrafinhas para levar e oferecer.

Numa outra barraca vendem-se cogumelos desidratados, esterilizados e em pó. São todos apanhados nestas serranias em redor de Macedo de Cavaleiros. Os cogumelos suscitam-me muita curiosidade, identifico apenas uma espécie comestível, o frade, alcunhado “Tortulho” na região do Porto. Peço conselhos para confeccionar estas espécies que compro e surpreendo-me com as possibilidades gastronómicas que me são sugeridas. Percebo imediatamente que falo com um perito em cogumelos, dá-me sugestões de confecção, fala-me das potencialidades para a região «Os cogumelos Portugueses têm muita aceitação no estrangeiro, somos dos poucos países que não foram afectados pelo desastre de Chernobyl. Muitos estrangeiros vêm cá buscá-los e saem daqui camiões cheios deles. Lá fora o preço duplica várias vezes e depois regressam a Portugal com rótulos estrangeiros a preços elevadíssimos…Organizamos cursos de identificação e confecção de cogumelos. É incrível a variedade de formas para os confeccionar. Também queremos ensinar às pessoas as maneiras como os podem aproveitar … o meu desejo e a minha luta é dinamizar isto, sensibilizar as pessoas e ensiná-las a aproveitar as potencialidades que existem aqui. Cativá-las. Não temos apoios nenhuns do estado. Isto está cada vez pior e, se não fossem as Câmaras Municipais, haveria muito menos emprego. Criam umas leis absurdas que só desincentivam e destroem a produção local, obrigam os agricultores em nome da higiene e da segurança alimentar a mudar subitamente de hábitos sem lhes dar contrapartidas, pessoas que há dezenas de anos produzem alheiras de determinada forma…deliciosas. Muitas vezes tudo isto não passa de um pretexto para obrigar as pessoas a comprar mais umas máquinas fabricadas num país qualquer da União Europeia e de pagar mais um imposto, e quem não entrar nesta rotina é posto de lado. Tenho umas oliveiras com mais de cem anos…as azeitonas têm de ser apanhadas à mão, não se podem apanhar com máquinas…não é a mesma coisa! No fundo, quero que estas pessoas se sintam dignas»

(Para mais informações sobre esta Associação Micológica, ver TERRASDOROQUELHO)
Dignidade não falta aqui em Trás-os-Montes. No regresso ao Porto paro em Murça para almoçar. É uma vila muita pequena, ao longe parece feia, com uma arquitectura desarmoniosa e umas maisons a destoar, contudo o centro é muito agradável, arranjado, limpo, com alguns edifícios históricos e a famosa Porca de Murça, monumento milenar em pedra, numa praça. Não se vê quase ninguém e as poucas pessoas com que me cruzo são maioritariamente idosas. É uma pasmaceira. O que será disto daqui a vinte anos, quando a maioria da população que aqui vive morrer?

Lembram-se das muitas maternidades, centros de saúde e escolas encerradas que ainda iam dando emprego em muitos sítios do país ?

Dignidade há muita aqui em Trás-os-Montes.

Detalhes de Podence


Chocalho fálico

Casa do Careto (traje de Careto e Marafona)

Centro de Murça


terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

Trilho dos Caretos (com os burros de Miranda)




O burro Mirandês é a única espécie autóctone de Portugal e encontra-se em vias de extinção. Antigamente era muito usado nos trabalhos agrícolas como animal de carga e tracção. Com o abandono dos campos e a desertificação da região, tornou-se desnecessário e entrou em vias de extinção:  «Ainda se vêem uns velhotes com mais de sessenta anos a caminho das feiras, montados nos burricos, com os alforges cheios para vender toucinhos e produtos artesanais», diz-me um elemento da Associação para o Estudo e Protecção do Gado Asinino (AEPGA)


É malta que veio de Miranda do Douro, a 80 Km daqui. Trouxeram quatro burros numa carrinha e participam nas Festas do Entrudo Chocalheiro, levando a passear as crianças e os adultos,  montados nos burros até à albufeira do Azibo. Existem três centros de recuperação dos  animais no concelho de Miranda do Douro.
O pessoal da associação é malta urbana, a maior parte deles nasceu fora de Miranda e procura uma forma alternativa de vida, mais natural e essencial.  É gente nova, idealista e  empenhada na  recuperação dos burros:  um sinal de esperança para o futuro destas terras.

Os burros começam a ser usados em passeios turísticos pela região e  em asinoterapia:  «São muito bons para as crianças», também são vendidos  a quem estiver interessado na sua preservação e em ter um burro por companhia. São muito sociáveis e criam laços afectivos muito fortes uns com os outros:
«Uma vez um deles ficou sozinho porque o outro burro foi vendido. Deixou de comer, emagreceu e andou muito triste. Demos-lhe medicamentos, foi consultado pelo veterinário várias vezes, mas nada. Até que lhe arranjámos outro burro para  fazer companhia, começou a animar e agora já roça o pescoço no outro». Portanto, são animais que podem ficar muito tristes e deprimidos se lhes retiram um companheiro, mas também podem ser muito esquisitos entre eles. Há burros que não vão com a cara, neste caso com o focinho, uns dos outros, sabe-se lá porquê e evitam-se.
Actualmente há dezassete burras prenhas nos centros de recuperação, o que é muito bom. 
Algumas características fisionómicas que os distinguem das outras raças são o pêlo mais comprido e grosso, a mancha branca na boca e no nariz e a altura acima da média.

Para obter mais informações sobre a AEPGA, clique aqui.

O passeio desenrolou-se calmamente desde a Casa do Careto em Podence, onde uma placa indica o início do Trilho. Passa-se pelo centro da aldeia e depois atravessa-se um pequeno viaduto de cimento sobre o IP4 e entra-se em caminhos rurais de terra batida, bem delineados, que nos levam até à Praia Fluvial da Ribeira, na albufeira do Azibo, sempre visível desde o início do percurso. Este trajecto é plano, fácil de realizar e com 4,1 Km de extensão.
Para saber mais detalhes sobre os percursos pedestres no Concelho de Macedo de Cavaleiros, clique aqui.

Pormenor da albufeira do Azibo
Uma parte do trilho
Sempre com a água da albufeira visível
Praia da Ribeira (Azibo)
Apresento-vos um Burro de Miranda
Mais trilho

domingo, 14 de fevereiro de 2010

Entrudo Chocalheiro

Está a decorrer em Podence, Macedo de Cavaleiros, o Entrudo Chocalheiro. Vim para ver os famosos caretos, figuras cada vez mais populares na nossa cultura. Aparecem em capas de CDs (“Danças e Folias” da Brigada Victor Jara), Festivais da Canção e manhãs televisivas dos canais generalistas. Já todos devem ter visto algures uma destas figuras, na televisão pelo menos, ou numa revista qualquer.



A pequena localidade de Podence está apinhada de gente, o grupo de Bombos das Arcas anima a rua com muita percussão e gigantones, um careto deixa-se fotografar pelos inúmeros turistas enquanto não surgem os restantes companheiros. Há algumas centenas de pessoas. Esta rua parece demasiado exígua para receber tanta gente. A festa desenrola-se apenas neste extremo da aldeia, onde se situam as barraquinhas de artesanato e de iguarias regionais (mel, enchidos, licores, queijos) e a Casa do Careto.



A percussão ainda não terminou e já um grupo de jovens gaiteiros actua a poucos metros dali. O som dos bombos mistura-se com as gaitas de foles, a multidão dança timidamente e aplaude as actuações. Alguns caretos surgem da outra extremidade da rua, com paus e chocalhos, metem-se com as mulheres, as mais novas principalmente, movem as ancas para lhes bater com os chocalhos que trazem agarrados à cintura. Algumas riem-se, outras não acham tanta piada devido à violência do embate dos chocalhos. As pessoas mais velhas da terra dizem que hoje as mulheres não ficam tão pisadas como antigamente.



Esta tradição esteve quase a perder-se no fim do Estado Novo e devido à forte emigração que se lhe seguiu. Foi reavivada em 1985 nas Jornadas de Cultura Popular da Academia de Coimbra e actualmente parece estar a viver um período bastante vigoroso. Alguns Facanitos, miúdos que se trajam de careto, andam já no meio dos adultos a aprender as tropelias e são eles a garantia da continuação desta tradição nos próximos anos. A afluência de turistas e o interesse, que eu julgo ser crescente, por estas tradições também ajuda.



Apenas ao sexo masculino é permitido este disfarce. Vestem-se com colchas franjadas de lã verde, vermelha e amarela e chocalhos na cintura. Máscara em couro, latão ou madeira, de nariz pontiagudo e pintada de preto ou com uma das cores das franjas. Trazem consigo um pau que os apoia nas corridas desenfreadas que dão.



A origem desta tradição è pré-cristã, num misto de rituais pagãos ligados à fertilidade, em que se procurava agradar aos Deuses para obter uma boa colheita, sendo permitidas as mais loucas tropelias antes do início do recolhimento e contenção da Quaresma.



Actualmente vive-se muito para a encenação, foi essa a sensação que tive. Estavam presentes dois canais televisivos e muitas das correrias foram realizadas propositadamente para as câmaras. Imensos turistas andavam atrás dos caretos de máquina fotográfica e câmara de filmar na mão, que nem uns autênticos paparazzi. Todos querem uma imagem destas figuras fascinantes e misteriosas (incluindo eu), apanhá-las no melhor ângulo possível e levar uma recordação deste carnaval original e antigo. Este afã retira muita espontaneidade ao Carnaval. Os turistas têm uma postura bastante passiva, vêm observar e fotografar os caretos, pouco se misturando com eles.


Amanhã o programa promete bastante, com o Teatro de Rua da “Mandrágora”, a Queimada, o Baile e os Gaiteiros de Lisboa pela noite dentro.



quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Castro de Romariz (Santa Maria da Feira)


O Castro de Romariz foi habitado entre o século IV a.c e o I d.c, em resultado de um crescimento demográfico que se registou neste período histórico e de uma evolução tecnológica nos utensílios usados, que correspondeu à Idade do Ferro.

Esteve dominado por um povo, os Túrdulos Velhos, que migraram da Andaluzia Ocidental e trouxeram consigo hábitos e progressos técnicos da região onde viviam, sob influência da cultura Tartéssica.

Os Tartessos tiveram  contactos comerciais com os povos do Mediterâneo Oriental, principalmente os Fenícios,  que graças à navegabilidade dos rios Guadiana e Guadalquivir, aqui vinham transaccionar mercadoria em troca de estanho e ferro, metais em que a Península era rica. Foram uma entidade bastante evoluída e a primeira a ter uma organização política na Península Ibérica. Além das culturas da vinha e do azeite, fundiam o ferro e praticavam a olaria com torno.

No Museu do Convento dos Loios, em Santa Maria da Feira, poderão ser obtidas mais informações.