terça-feira, 21 de julho de 2009

As Aldeias das Margens do Rio Vizela


O concelho de Fafe tem 53 000 habitantes numa área de 219 Km2, o que dá uma densidade populacional de 246 hab/Km2, sensivelmente o dobro da média nacional. O que não surpreende porque estamos no Minho, uma região que sempre se distinguiu pela elevada concentração populacional.
Sempre ouvi dizer que do Norte do país partiram para a emigração milhares de Portugueses, muitos seriam daqui destas paragens. Agora, no verão, começam-se a ver muitas matrículas Francesas e algumas Espanholas pelas aldeias.

Surpreende como estes lugares irrigados, de clima ameno, com muitos pastos para o gado e potencialidades para desenvolver diversos tipos de cultura tenham sentido por diversos períodos dificuldades em fixar as pessoas.

Actualmente, são poucos os que ficam para trabalhar na agricultura, deixou de estar incutido na mentalidade a vontade de trabalhar nos campos. Muitos foram educados para tirar um curso e ganhar o mais possível, implicitamente a agricultura é vista como coisa antiquada dos velhotes das aldeias.

E a indústria próxima, do Vale do Ave, está em declínio acentuado contribuindo novamente para o aumento da emigração.

Restam os serviços. Por que não apostar na fixação das pessoas através dos serviços?

Quanto maior for o número de pessoas a viver nestes locais e a receber um salário, maior será o número de potenciais consumidores do que se produz localmente e de frequentadores do comércio local, contribuindo para que os vizinhos tenham maiores possibilidades de trabalho e de segurança económica.

Ao consumir produtos obtidos próximos de casa, está-se a contribuir para um ambiente mais sustentável porque haverão menos gastos de energia com os transportes.

É necessário que hajam políticas acertadas e vontade de o fazer.

A criação de percursos pedestres concelhios é uma das melhores formas de trazer pessoas às aldeias, de dinamizar o comércio local e, principalmente, de contribuir para um desenvolvimento sustentável, em que se respeitam as paisagens e as tradições.
Essa é a maior riqueza que pode haver para mostrar, que é o que torna cada local único e distinto dos restantes.


Os festivais de pedestrianismo contribuem para divulgar o que de melhor há em cada em destes sítios, que são as paisagens locais, sempre diferentes consoante a região, a história, a cultura, as pessoas…

No Concelho de Fafe existem 10 percursos pedestres marcados pelos Restauradores da Granja e realiza-se o Festival Montes Longos, que dá a possibilidade aos participantes de percorrerem um desses percursos.

Felizmente há cada vez mais gente à procura desse contacto físico e emocional com a natureza, os lugares e os outros.


Para mim, foi mais um momento de alegria e de encontro com os amigos que já não via há dois meses. Companheiros de algumas das mais bonitas caminhadas que fiz até hoje, não só pela beleza desses sítios, mas também por, simplesmente, estar com eles.

Realizamos o PR2 de Fafe, As Aldeia das Margens do Rio Vizela, um percurso circular de 15 km, adequado ao tempo de calor, com muita sombra e água e um nível de dificuldade médio.

O início foi no Largo da Igreja de Lagoa. Seguimos por um caminho bem definido debaixo de uma vegetação frondosa em direcção à Ponte de Pereirola e Pedraído, a primeira povoação do trajecto.
Em alguns pontos torna-se visível o recorte das serras circundantes com uma vegetação rasteira, as aldeias nas encostas e os enormes blocos de granito de configurações arredondadas. Os espigueiros, as eiras, os prados rodeados de árvores, o rio Vizela e os ribeiritos, dão um aspecto bucólico ao trajecto.

Nas aldeias encontram-se vendedoras de fruta e da doçaria típica. Comprei, para conhecer, o Pão-de-ló de Fornelos, os Cigarros Doces, a uma senhora que me garantiu que não me arrependeria, e uns tremoços.

Paramos para lanchar num prado na margem do Vizela, um sítio convidativo para uma soneca deitado na erva à sombra dos amieiros. Tivemos que seguir o ritmo dos restantes caminheiros, não havia tempo para contemplações ou dormidas breves, havia que chegar ao fim por volta das duas e meia. Todos os participantes nos diferentes trajectos reunir-se-iam em Aboim para a confraternização final.

Ao passar nas aldeias encontramos vários fontanários públicos em que soube tão bem reabastecermo-nos de água e refrescarmo-nos. Estávamos na hora de maior calor e o terreno na parte final era mais aberto e exposto ao sol.

Este trajecto tem predominantemente amieiros e choupos, junto do rio, e carvalhos. Ainda não foi invadido pelas árvores exóticas, estranhas a este ambiente, que destroem a paisagem e empobrecem os solos.

Chegado a Lagoa lavei os pés no tanque do largo, tinha-os cheios de pó do último troço, em estradão de terra.

Seguimos todos para o largo da igreja em Aboim, de onde se desfruta de uma admirável panorâmica do maciço do Gerês ao longe.
Reencontramos o restante pessoal dos Restauradores da Granja, sempre simpático, bem-disposto e divertido.
Depois da confraternização e almoço final, com direito a recordações da organização, fomos à barragem da Queimadela para um mergulho. O Domingo não ajudou. Estava apinhada de gente e mudamos de ideias, decidimos parar num café no regresso a casa.

Mais um dia de convívio saudável e feliz que estava a terminar. No café, outros momentos de boa disposição e conversa com projectos para novas caminhadas e novas descobertas.
Para já, que as férias se aproximam, cada um seguirá a sua vida, os seus passeios em família ou com os amigos, as suas deambulações de verão. Mas o reencontro está prometido para o regresso em Setembro, com vontade de voltar a Fafe e de trilhar outras serras.

A Câmara de Fafe e os Restauradores da Granja estão de parabéns por mais uma organização do Festival de Pedestrianismo Montes Longos. Que continuem, como até hoje, a divulgar o património e ambiente local com este espírito saudável e de respeito pelas tradições.



sábado, 18 de julho de 2009

Vislumbres de Espinho


O Museu Municipal de Espinho foi inaugurado há poucas semanas na antiga fábrica de conservas Brandão Gomes,  recuperada para receber o espólio histórico da cidade e da fábrica.
É um espaço com um interior amplo,  de  dois pisos e corredores largos. No primeiro piso está exposta a história da antiga fábrica desde a  fundação, no fim do século XIX, até à falência e encerramento em 1985; a secção dedicada à Arte da Xávega e um espaço para as exposições temporárias, virado a poente, com uma soberba vista para o mar e para a chaminé que resta da fábrica.  Neste momento alberga  uma exposição de escultura.
No piso superior está a decorrer uma exposição temporária de fotografia – Litorais, até 31 de Agosto.

Este foi o final de um caminho iniciado em Grijó. Duas horas depois encontrava-me em Espinho a fotografar os barcos de pesca artesanal.
Esclareci algumas dúvidas no museu. Não fazia ideia que no seu interior encontraria a História da arte da Xávega e dos pescadores de Espinho. Foi uma surpresa agradável, documentada com muitos textos e fotografias fantásticas.

A Arte da Xávega é um sistema de pesca artesanal de arrasto. O barco era rebocado do mar pelos bois, prática que ainda vigorava nos anos setenta do século passado, sendo os animais gradualmente substituídos pelos tractores.


Os barcos têm uma origem muito antiga que remonta ao Médio Oriente e foram possivelmente introduzidos pelos Fenícios.

Outra secção do museu retrata a vida das famílias vareiras, documentada em textos, fotografia e filmes.


O multimédia é uma constante. Há vários monitores a partir dos quais podemos, interactivamente, aceder à diversa informação dispersa pelo museu.

Quanto às conservas, é apresentada de forma  muito detalhada a evolução da fábrica e das condições sociais dos  trabalhadores.  São mostrados vários objectos e documentos relacionados com a história das conservas em Portugal. O mais curioso para mim foram os cartazes e o design das embalagens.

O museu ainda não funciona a 100 porcento, falta a loja de merchandising que abrirá brevemente e os espaços pedagógicos do piso superior, que pareceram encerrados ainda.

No fim da visita foi-me indicada a Biblioteca Municipal de Espinho que possui as fotografias originais expostas no Museu. Não existem à venda em postal, mas podem ser acedidas através do site http://www.cm-espinho.pt/, uma delas é a que se vê no início desta mensagem.

A caminho de Espinho passei pelas freguesias de Guetim e Anta. O costume: povoamento disperso, densamente habitado, e os vestígios de um passado rural que quase já não existe.
Espigueiros, quintas e bancos de pedra na entrada das casas mais antigas para os momentos de descanso e tagarelice com os vizinhos, que hoje já não têm utilidade porque perdeu-se o hábito de tagarelar tranquilamente ao fim do dia, sem pressas, sem televisão, talvez com um copinho de tinto na mão nas noites quentes de verão, as mulheres a coscuvilhar com a vizinha enquanto os homens trabalhavam nos campos... Misturadas com estes vestígios do passado  há as urbanizações e algumas  vivendas aparatosas que foram surgindo no meio desta paisagem rural, por vezes desenquadradas e feias,   sem qualquer ordenamento e previsões de habitabilidade. Resultado: muitas casas e apartamentos novos por vender, enquanto que as habitações tradicionais,  mais bonitas e elegantes, muitas delas obviamente a necessitar de restauração, estão devolutas e aos poucos vão desaparecendo e com elas a memória do nosso passado.  

Contudo, houve algumas surpresas. Em Grijó passei numa rua com o nome de Quinta Amarela. Sabia que existe uma Rua da Quinta Amarela no Porto, não em Grijó. Nesta rua há uma casa senhorial muito bonita, a Quinta de Nossa Senhora da Conceição, propriedade privada que possui no interior uma capelinha, visível da rua.


Em Espinho vejo do outro lado da rua uma colega de Conselho de turma, chamo-a e ficamos ali a palrar no passeio. Pensamos em fazer um almoço na próxima semana com os outros elementos da equipa pedagógica, em jeito de despedida das reuniões e das inúmeras dores de cabeça causadas pela nossa turma de alunos.

No número 277 da rua 19 fica a casa onde viveu o escritor Manuel Laranjeira. Uma figura que conviveu com Miguel de Unamuno, o escritor e filósofo Espanhol que escreveu um livro intitulado Viagem a Portugal, no qual  considerou o povo Português depressivo e dado a suicídios, exemplificando com os casos abundantes na história recente da época: finais do século dezanove, princípios do século vinte: Camilo Castelo Branco, Antero de Quental, Soares dos Reis,...
Manuel Laranjeira explicou  a Miguel de Unamuno a razões desse estado de alma colectivo e do seu próprio espírito depressivo.
Numa outra correspondência com Amadeu de Souza-Cardoso, Manuel Laranjeira mostrou-se muito céptico da vida e descrente das possibilidades de sentir alegria verdadeira, mesmo perante a possibilidade de visitar o amigo em Paris. Ele próprio também se suicidou, aos  34 anos.

No mar, sempre o vento. É raro o dia de Verão em que não há vento junto ao mar,  a famosa Nortada, comum nos dias quentes e que torna a presença na praia desagradável. O mar: frio e bravo, característico desta costa Atlântica, que continua a sustentar muitas famílias de pescadores e abundante de sardinhas, vendidas antigamente  nas latas de Conserva Brandão e Gomes.
Grijó: casa rural

Detalhe do batente

Espinho em dia de nortada

O mar bravo 
Os barcos da Xávega. Este formato existe há centenas de anos. A única modificação foi a introdução de motor
Pormenor das proas
Uma da tarde: Bairro dos pescadores
Azulejos numa casa de Espinho
Museu Municipal de Espinho (antiga fábrica de conservas Brandão Gomes)



Produtos comercializados pela fábrica