domingo, 3 de maio de 2015

Las Médulas


Um exemplo notável da capacidade criativa e engenho dos Romanos é Las médulas, na província Espanhola de Leon.
A montanha era muito rica em jazidas de ouro. Para o extrair, os Romanos não foram de meias medidas, construíram túneis e galerias de onde iam extraindo o ouro e por fim, para não se desperdiçar nada, resolveram derrubar a própria montanha. Para isso, represaram um rio, encherem os túneis com água que, com a pressão, fez implodir as encostas. Os restos de lama e terra foram canalizados para outro lago, numa cota mais baixa, onde era garimpado o ouro.
Deste trabalho realizado há centenas de anos restam as encostas abruptas, estéreis e ocres, alguns canais e grutas. O resultado é uma paisagem única, transformada pela ação do Homem, e um ambiente natural exuberante e verde. Os castanheiros antigos e imponentes dão um ar bucólico e tranquilo, no meio da neblina e da chuva parece o cenário mágico de um conto de fadas.  

Las médulas são património daUnesco. Há um percurso pedestre, curto e fácil, que contorna a base da montanha, por estradão de terra, delimitado a espaços por um gradeamento de madeira e com painéis interpretativos que explicam o processo de extração do ouro.


Aqui passa um caminho alternativo do caminho Francês de Santiago: o Caminho de Inverno. Quando o Cebreiro ficava coberto de neve, tornando muito difícil a  passagem, os peregrinos faziam o desvio por esta região, mais a sul. Um ponto de passagem que vale a pena conhecer: pelas belezas naturais, património rico em artesanato e gastronomia, arquitetura tradicional, história e percursos pedestres. 











sábado, 2 de maio de 2015

Parque Natural de Somiedo – Ruta de El Cornon: PR.AS – 10


O Cornon é o ponto mais alto do parque natural de Somiedo, a uma altitude de 2194 metros,  no extremo sul da região, entre a província de leon e as Astúrias. O percurso até ao cume é um dos 12 trilhos referenciados no site do parque. A descrição encontra-se aqui (em PDF).

É um percurso apetecível: por ser o ponto mais alto do parque, pelo desafio que é subir um declive muito acentuado, pela dureza, pela expetativa de ver grandes paisagens e, por fim, para sentir o gozo de conquistar mais um cume. Das várias hipóteses que se colocaram na escolha do trilho, no pouco tempo que aqui estaríamos, esta opção foi consensual pelos aspetos referidos.

Começa na aldeia de Santa Maria  Del Puerto, situada na extremidade sul do parque natural, porta de entrada na província das Astúrias, para quem vem de Leon pelo Puerto de Somiedo.

A parte inicial é pouco íngreme: atravessa campos agrícolas e pastagens, depois vai aumentando gradualmente de declive, até  entrar na alta montanha. Os vários cumes que nos rodeavam, encobertos pelo nevoeiro denso; a chuva que persistia em cair, por vezes com alguma intensidade; o frio que se começava a sentir e as camadas de neve, cada vez mais frequente, à medida que subíamos, não auguravam nada de bom.

Continuamos, persistentemente, a confiar que as condições atmosféricas iam melhorar, que  por estarmos a atravessar uma zona de altitude intermédia, com mau tempo, acabaríamos por encontrar, a uma cota mais elevada, o sol e o bom tempo.

As condições continuaram a piorar e a nossa situação física e psíquica também começou a ressentir-se. Apesar dos impermeáveis e das sapatilhas em Gore – Tek, não foi possível evitar que os pés e o corpo ficassem encharcados. Com tanto uso, mesmo os materiais de melhor qualidade, acabam por perder as propriedades iniciais: a impermeabilização, a transpiração e a resistência.

No meu caso, faltavam bastões e rede de neve para as sapatilhas; as polainas só atrapalhavam, estavam sempre a descair; as sapatilhas não eram as mais adequadas, ao caminhar na neve escorregava e para avançar dez metros tinha que ir quase a gatinhar. Não levei luvas, as mãos começaram a ficar enregeladas. O impermeável, que foi  útil em várias ocasiões, desta vez serviu de pouco, com o vento forte estava sempre a abrir. Fiquei enlameado e encharcado – o que até foi divertido. Mas o problema é que ao parar, e  com o arrefecimento do corpo, senti as costas e os pés frios e molhados, o que não foi agradável.

Comer foi complicado porque estava tudo molhado, com lama e neve,  e não tínhamos onde nos abrigar. Por fim, arranjamos um prado, já no regresso, onde comemos de pé e à pressa.

Não chegamos ao Cornon. A decisão de inverter a marcha não foi fácil, ao início. É frustrante ter que desistir de um desafio, contudo, acabou por prevalecer o bom senso. Teria sido perigoso continuar a caminhar. Não é brincadeira estar numa montanha com nevoeiro denso, camadas grossas de neve, muito incerta e traiçoeira, chuva, vento.  Eu não estava preparado para tais condições. No verão sim, com sol o meu equipamento teria sido adequado, quase.

Não culpo o mau tempo, culpo-me a mim, que não fui preparado como devia.

No regresso, para não voltar pelo mesmo caminho, decidimos seguir o GPS que nos dava uma trilha inversa, paralela àquela por onde subimos. Provavelmente essa trilha foi marcada no verão, porque o regresso também se revelou complicado. Havia camadas de neve, que provavelmente escondiam a trilha original e regatos cheios de água, que no verão deviam estar  secos. Tivemos que andar às voltas para encontrar caminhos seguros, contornar rochedos e declives ingremes, agarrar arbustos para não escorregar.

Quando nos aproximamos da aldeia, o tempo começou a melhorar. O que permitiu secar em parte, com a ajuda do vento, a roupa molhada que se agarrava ao corpo e deu para limpar na relva dos prados muita lama encrustada nas sapatilhas.

Durante a caminhada questionei-me por que razão não vou mais vezes aos centros comerciais. Qual a vantagem de estar debaixo desta intempérie, ainda sem saber como sair daqui e como me vou safar desta, quando podia estar no conforto do lar a ver televisão ou a ver montras. Estava bem acompanhado e isso era importante, não iria ficar mal, mas senti uma certa dose de insegurança. A resposta que encontrei é que me faz bem andar na lama, à chuva, ao vento, na neve. Sinto-me livre. Com todo o conforto que se tem em casa, a nostalgia destes momentos é forte. É algo de primitivo e primordial quando se está em contacto com a natureza crua e dura. Nós, que vivemos em ambientes cada vez mais assépticos e sedentários, temos a nostalgia de um tempo essencial, de vidas nómadas e incertas.


Pola de Somiedo
                          
                            
                            
                             
                          
                              
                          
                           
                          
                          
                          
A caminhada da gente feliz
                           
La Peral


Perlunes:

 Nos confins das Astúrias fica a aldeia de perlunes. Para lá chegar é necessário, a partir de Pola de Somiedo, fazer 6 quilómetros por estrada, onde só passa um carro de cada vez. Com muitas curvas e precipícios, que metem medo só de olhar lá para baixo. No inverno a aldeia fica isolada. Altas camadas de neve cortam a única estrada de acesso. A aldeia terá uns cinquenta habitantes, as casas são de xisto e hoje vive-se de algum turismo, do aluguer de apartamentos rurais e do artesanato. Os ursos passam perto. Todos os dias o guarda-florestal vem de jeep, desde Pola, reabastecer de comida alguns pontos estratégicos de passagem do urso. Para o observar é necessário uma grande dose de paciência, muito silêncio e um esconderijo.
Estrada para Perlunes
                         
Aldeia da Aguino, na estrada para Perlunes
Perlunes
                           

sexta-feira, 1 de maio de 2015

Parque Natural de Somiedo - Ruta de Valle del Lago: PR.AS - 15.1

O parque natural de Somiedo fica mais ou menos a cinco horas de carro do Porto, na cordilheira cantábrica das Astúrias. Possui inúmeros vales escavados e profundos, cumes e aldeias que ficam isoladas pela neve no inverno, matos, bosques, pastagens e pequenos lugarejos encavalitados nas encostas íngremes da montanha ou perdidos no fundo dos vales, atravessados por riachos.

O parque tem vários trilhos sinalizados, desde os de alta montanha, com um grau de dificuldade muito acentuado, e outros de cariz bastante mais acessível. É só pedir mais informações na oficina de turismo de Pola de Somiedo, a principal localidade do município.



A Ruta de Valle del Lago (PR AS - 15.1) está marcada com as riscas brancas e amarelas, é um percurso acessível, realizado em parte por um largo estradão de terra, desde a aldeia de Valle del Lago até ao Lago del Valle. A informação PDF, em Castelhano,  encontra-se aqui.


Seguimos até ao lago, artificialmente criado através  da construção de um açude na ribeira do vale, pelo trilho mais a norte e regressamos pelo lado sul, ao longo da encosta da montanha. Um caminho mais elevado e irregular que  permitiu observar, de uma perspectiva mais abrangente, a paisagem. A encosta não é tão fácil como o lado norte,  ganha, porém, na diversidade de panorâmicas, vegetação e fauna: um cervo fugidio  subia a cascalheira ao longe  e  carvalhais  bordejam uma parte  do trilho.


Os abrigos, de forma circular e tectos de colmo,  são inconfundíveis, junto da sua braña (prado).


O grande ex-libris e símbolo da região, pela raridade e por ser o último reduto da espécie na península Ibérica, é o urso pardo. Esteve em vias de extinção e hoje calcula-se que existam cerca de 100 indivíduos dispersos pela cordilheira cantábrica, sendo o parque natural de  Somiedo o que tem a maior densidade de ursos. A população aumentou muito nos últimos anos devido aos esforços ambientalistas. Uma das medidas adoptadas foi a plantação de cerejeiras nas montanhas: os ursos são grandes apreciadores de cerejas. Outra foi a colocação de alimentadores em locais específicos de passagem. Existem queixas de pilhagens de colmeais pelos ursos, que estoicamente suportam as picadas de centenas ou milhares de abelhas por um punhado de mel. 
Placa que indica o início da aldeia onde  começa o trilho



As casas tradicionais que foram adaptadas a bungalows

Características do percurso no início do trilho



A placa indica o desvio para o rio Saliencia, ao longo do qual e das branãs envolventes  existe outro trilho sinalizado


Lago El Valle

Abrigo tradicional na margem do lago







As Astúrias é uma região produtora de sidra, tem até uma comarca da sidra, assim como nós em Portugal temos as regiões demarcadas do vinho. Há uma forma tradicional de beber a sidra, que é colocar a garrafa um pouco mais alto do que a cabeça e vertê-la para um copo colocado na outra mão. Pouco recomendado a gente inexperiente porque não é fácil acertar com o copo. Para evitar que o chão fique sujo e molhado com os restos de cidra, há recipientes junto das mesas onde caem os desperdícios.
Enche-se o copo até um quinto, bate-se na mesa (para fazer borbulhar a sidra) e bebe-se de golada.  

Sidras a refrescar no rio Somiedo