terça-feira, 26 de março de 2019

Caro António Guterres


Caro António Guterres,
tenho uma grande estima e consideração por si. Lembro-me perfeitamente do seu discurso humanístico e de causas, quando foi primeiro ministro de Portugal. Frases que me ficaram na memória do seu governo, sobre as pessoas, mais importantes do que os “números” económicos, e a importância que atribuiu à educação.
Como Português fiquei orgulhoso ao vê-lo ocupar o cargo tão importante e de grande responsabilidade de Secretário Geral das Nações Unidas, como Português também sei, por conhecê-lo da política nacional e das causas que defendeu anteriormente, o quão merecido  lhe foi a atribuição do cargo.

Caro António Guterres,
a maior causa de sempre da história do planeta é a luta contra as alterações climáticas, porque dela depende a sobrevivência do próprio planeta. De nada terá valido a evolução técnica, científica e filosófica, as maravilhas criadas pelo engenho humano, onde se incluem as mais diversas e sublimes manifestações artísticas, se não formos capazes de impedir a destruição deste maravilhoso embrião que gerou a diversidade extraordinária de vida e cultura, onde todos  construímos os nossos laços afetivos, onde amamos e sonhamos.  
A luta contra as alterações climáticas é indissociável de todas as outras lutas.  
O respeito pela autonomia dos povos, a justiça social, o direito básico à alimentação, a uma vida saudável e tranquila, estão relacionadas com a preservação dos ecossistemas planetários, onde residem inúmeros povos e culturas de uma incrível diversidade, construída ao longo de milhares de anos.
A Organização das Nações Unidas é talvez a maior criação política da humanidade, dela resultou a Declaração Universal dos Direitos do Homem e a Carta da Terra, que emancipam a igualdade e a liberdade que todos os humanos desejam e o respeito por todos os suportes de vida que permitiram o florescimento desta tão complexa e, simultaneamente, tão frágil civilização.

Caro António Guterres,
considero que as Nações Unidas, como órgão supra nacional, acima dos interesses territoriais, de verdadeira índole altruísta, tem o maior de todos os desafios:  sensibilizar os estados -nação, respetivos líderes políticos e económicos, grupos empresariais e multinacionais, que o crescimento económico e o lucro de nada valem, se não formos capazes de ter um ambiente são.  
O dinheiro não salvará ninguém de uma atmosfera venenosa, que insidiosamente se vai criando, do lixo crescente e dos alimentos contaminados.   
Chegou o momento de mudar o rumo extrativista que rege as relações económicas: ouçamos as vozes dos povos indígenas, cuja sabedoria ancestral nos ensina que somos todos filhos da terra, ouçamos a sua voz, respeitemos o ritmo e a homeostasia dos ecossistemas.




Caro António Guterres,

o senhor e eu fomos abençoados  por recebermos um planeta belo e termos a oportunidade de assistir a algumas das suas maravilhosas dádivas: o senhor,  com as suas raízes na Beira Baixa, terá visto a neve cair na serra da Estrela, cobrindo de um manto branco o vale de Manteigas, o imenso céu azul estendendo-se até Espanha, o Zêzere límpido e  rumorejante correndo entre as  bétulas junto ao Covão da Ametade; eu, com as minhas raízes no Minho e Douro Litoral,  posso dizer que ainda sou do tempo em que se apanhavam enguias e trutas nas ribeiras que desaguavam no Douro, dos imensos carvalhais na serra do Gerês e dos lobos na serra de Freita.  
O nosso maior desafio é dar aos vindouros as mesmas oportunidades de assistir às maravilhas que o planeta criou.
Seremos capazes?


terça-feira, 5 de março de 2019

Entrudo de Lazarim


Os amieiros devem ter sido muito  abundantes nas margens dos rios de Lazarim. É dessa madeira que são feitas as máscaras de Carnaval, é mais facilmente trabalhada por ser leve e consistente. Os poucos artesãos vão entalhando a madeira com o formão, limando arestas e amaciando-a  com a lixa, até  adquirir a feição desejada. O trabalho demora uma semana e o preço, algumas centenas de euros. São belíssimas, representam demónios, personagens bizarras de narizes compridos a lembrar falos, deuses Báquicos de frutos e serpentes esculpidas na face de madeira. É muita a criatividade dos artesãos: um etnólogo usaria os conceitos de surrealismo popular, de inconsciente coletivo, por aí… lembram os bonecos de barro da Rosa Ramalho, aquele artesanato de Barcelos que se tornou famoso pelas mãos de pessoas analfabetas, tão forte de significado.  Julgo que as máscaras de Lazarim representam algo idêntico, muda apenas o material com que se manifesta: dão azo a superstições, medos, fantasias religiosas e pagãs, escondidas no subconsciente. Os caretos não falam, emitem por vezes uns grunhidos, de maneira a não serem identificados. Podem ser homens ou mulheres e são muitas as surpresas quando certo careto, que parecia ser homem era afinal uma mulher, e vice-versa.
Os caretos deambulam pelas ruas apinhadas de turistas, que fotografam tudo.  A chuva não demove ninguém, a mim dá-me a sensação ainda mais forte de carnaval genuíno, por ser inverno e porque os fatos cobrem totalmente o corpo dos figurantes. São feitos de vários materiais, com folhas de árvores, palha, tecidos grossos e coloridos.
Duas jovens bonitas trazem o compadre e a comadre, dois bonecos que vão ser queimados. Antes, leem o Testamento, “a Herança do Burro”. Ouvi várias referências aos “burros” da terra,  ditos jocosos e outros nem tanto, mais grosseiros e sem medir as palavras:  paneleiros, malcheirosos, impotentes, merdosos, deformados sexuais, coninhas, etc. Afinal o Carnaval deve ter sido um período de catarse, licenciosidade e diversão, onde tudo era permitido.  Depois é a vez do compadre falar das mulheres da terra e volta a ser outra catadupa de obscenidades.



O Sr. Albino, um dos artesãos de máscaras de Lazarim









Caretos Amarelos em protesto











Percurso Pedestre Terras de Dom Pedro Afonso (PR3 – Lamego)

Cartaz do percurso na aldeia de Lalim, em frente à Quinta do Terreiro


Dom Pedro Afonso foi um nobre,  dono destas terras e está sepultado em Tarouca. Mais detalhes sobre o senhor estão no panfleto PDF do percurso que descarreguei da internet, aqui. O principal motivo que me trouxe a Lamego foi assistir ao Carnaval de Lazarim, deu-se a coincidência de descobrir, mesmo em frente à entrada da Quinta do Terreiro,  o painel com o mapa do percurso e, assim,  decidi ir a pé até Lazarim seguindo uma parte do PR - a mais fácil - no sentido Lalim, Ponte Românica, Lazarim, evitando  maiores subidas e desníveis de 400 metros se fosse no sentido inverso, em direção a Melcões. O tempo estava incerto, ameaçando muita chuva, e eu próprio não me senti seguro em meter-me pelo meio da serra, fazendo subidas mais agressivas. A proprietária disse-me que todo o percurso estava bem sinalizado e de facto constatei isso no troço que fiz. A Quinta do Terreiro está a organizar caminhadas para a semana antes da Páscoa, ligando diferentes trilhos nos concelhos de Tarouca e  Lamego. As inscrições para o evento devem estar disponíveis na internet, mas terão que vasculhar bem porque não as encontrei.   Fiquei agradavelmente surpreendido com a iniciativa de querer associar o turismo rural aos eventos de natureza, de forma sustentável e preocupada com a preservação dos valores naturais e tradicionais – a Quinta do Terreiro guarda   vestígios das atividades que realizava no passado nos objetos que a decoram e nas  divisões, por exemplo a   adega foi transformada em bar, onde ainda se vê o lagar  do vinho e a prensa do bagaço.  Desejei a melhor sorte ao evento e saí em direção a Lazarim, caminhando  nas calmas entre os pinhais que ladeiam a  encosta do riacho que atravessa Lazarim e Lalim, ouvindo-o rumoroso e bucólico a correr  do meu lado direito, após a ponte românica. Não pude deixar de reparar nas bonitas flores amarelas das mimosas a crescer nas encostas da serra, beleza traiçoeira pois tratam-se de infestantes terríveis e altamente combustíveis.  Mas sim, foi um trecho agradável e interessante de hora e meia, a passo lento, até Lazarim.  À hora que cheguei ainda não tinha começado o desfile dos caretos, acompanhados pelos bombos da terra.  Nas barraquinhas, vendiam-se produtos artesanais e senhas para o almoço na cantina da escola. Entrei no CIMI (Centro de Interpretação da Máscara Ibérica), vi uma exposição de caretos tradicionais de várias regiões da península Ibérica e trajes e máscaras de Lazarim. Um espaço moderno que surpreende num sítio tradicional e antigo. O Carnaval de Lazarim fica para a entrada seguinte.
Quinta do Terreiro

Lalim

Lalim

Lalim

Lalim
Lalim



Lalim

Lalim

A ponte Românica na saída de Lalim







Lazarim 

Lazarim cada vez mais próximo

Entrada em Lazarim

Trajes de entrudo no Centro de Interpretação da Máscara Ibérica





segunda-feira, 4 de março de 2019

Lamego

Painel na escadaria de Nossa Senhora dos Remédios

Já ouvi dizer que Lamego é o local de Portugal com mais monumentos por quilómetro quadrado. Não sei se é mesmo assim, de qualquer forma é mais um exemplo da monumentalidade do nosso país. Não haverão muitos países no mundo, assim como o nosso. É o que melhor nos distingue. Preservemos os palácios, solares, castelos e arquitetura tradicional e não imitemos ninguém, só o que nos diferencia é que vale a pena e é pelo que temos de diferente e bem preservado que seremos valorizados e procurados. Associados à preservação arquitetónica e paisagística estão os produtos locais, a sua valorização, divulgação e a possibilidade de pequenos negócios para muita gente. Não destruam o interior com incêndios, plantação de eucaliptais, parques eólicos inestéticos, serras calcinadas e autoestradas caríssimas, em sítios onde pouca gente vive e que só prejudica quem lá está. Fiz as contas: 0,15€ em média por quilómetro, em certos troços!
Sobre Lamego: a escadaria do Santuário de Nossa Senhora dos Remédios tem aproximadamente 600 degraus. Na sacristia estão pendurados os retratos de todos os benfeitores da irmandade, desde 1857. Um deles é o de D. Antónia Ferreira, a famosa “Ferreirinha”. Sem dúvida que a igreja teve um papel muito importante em Lamego, há bustos de padres e bispos nas rotundas e praças da cidade, muitas igrejas antigas, a sé catedral, o seminário maior - um edifício bastante volumoso e que não passa nada despercebido para quem entra em Lamego pela A24.
Na igreja de Almacave, reuniu, no regresso de Zamora no ano de 1143, D. Afonso Henriques, depois de assinar com o rei de Leão o tratado da independência de Portugal.
Gostei dos muito dos doces que comi na pastelaria Nossa Senhora dos Remédios, os “Doces dos Remédios”. Não paro de me surpreender com os doces que vou descobrindo em Portugal, simples e ao mesmo tempo refinados e subtis no sabor. À noite, ao jantar, comi uma excelente posta de bacalhau assado, como há muito não me lembro, no restaurante Novo, no largo da Sé.
Na Quinta do Terreiro, na freguesia de Lalim, ofereceram-nos à chegada um cálice de Porto. Pelo sabor devia ser Vintage, ou Tawny, não percebo muito, mas era do tipo que se associa aos melhores vinhos do porto, um elixir servido a partir de um belíssimo frasco de cristal. No meio de toda aquela decoração senti-me um verdadeiro aristocrata, sentado na poltrona de cabedal a saborear o cálice. Belo local e com muito bom gosto!
Escadaria de Nossa Senhora dos Remédios

Deve pertencer à irmandade de Nossa Senhora dos Remédios, pois fica no jardim lateral

Rua da cidade



Programa do Entrudo de Lazarim


Igreja de Almacave


Rio Balsemão
"Doces dos Remédios" na pastelaria Nossa Senhora dos Remédios

Sé de Lamego

Entrada da Quinta do Terreiro, Lalim