sábado, 2 de agosto de 2025

Faial


Um dos poucos autocarros que passavam na rua, no sábado, chegou atrasado. Tivemos de fazer o transbordo. Esperámos o segundo autocarro nos Carvalhos. Demorou. Os passageiros à espera exasperaram-se com os atrasos, queixaram-se do incumprimento dos horários e da alteração das carreiras, sem aviso prévio. A paragem tinha horários afixados em dois  sítios diferentes. Numa delas, tive de me pôr na rua, de costas para o trânsito, para consultar as linhas. Que perigo! 

- Aqui estamos muito isolados - disse uma senhora que consultava o tempo de espera na aplicação Moovit.

Apanhámos um autocarro que não estava previsto. Uma hora e meia depois de sairmos da casa dos nossos amigos, chegámos à estação de metro D. João II. De carro, seriam apenas vinte minutos, sem engarrafamentos.

A partir do centro de Gaia, tudo se tornou mais eficiente, pontual e previsível. Na estação da Trindade, mudámos para a linha violeta em direção ao aeroporto. Uma carruagem tipo shuttle, moderna e confortável. Viagem tranquila.

O voo para Ponta Delgada partiu com uma hora de atraso. Perdemos a ligação da SATA para a ilha Terceira e, depois, o voo para o Faial. Recebi uma mensagem no telemóvel:

A SATA informa que foi reacomodado para o voo SP1458 PDL PIX de 02/08/2025 às 20:30. Para consultar os seus direitos e assistência, clique aqui azrair.com/direitos. Boa viagem.

Passámos as horas no terminal do aeroporto de Ponta Delgada. Comemos duas pequenas refeições com os dois vouchers que a companhia aérea nos ofereceu como indemnização. O pequeno terminal estava apinhado de turistas com roupa de trekking - os Açores são um arquipélago maravilhoso  para fazer caminhadas: têm mar, montanha, sítios planos, ribeiras, lagoas, diversidade de paisagens e um clima delicioso e constante. Tudo num espaço reduzido.

O Bombardier Q-400, velhinho, de 86 lugares, partiu lotado para o Pico. Os motores nas asas, mesmo ao nosso lado,  faziam um ruído pouco tranquilizador; os compartimentos da bagagem de cabine e a fuselagem rangiam por todos os lados - parecia que o avião se ia desconjuntar durante o voo. Abaixo de nós, o imenso algodão de nuvens brancas pairava sereno sobre o mar.

A montanha do Pico revelou-se no lusco-fusco fulvo quando aterrámos na pista. Temperatura amena, a sensação de chegada a um lugar distante, de clima diferente. Respirava-se o ar livre e desimpedido do Atlântico, o cheiro da terra frágil e porosa da ilha. 

Receávamos não ter táxi para chegar à vila da Madalena e apanhar o barco para a Horta. Eram nove e meia e outros, como nós, esperavam que surgisse alguém, no meio da noite,   com transporte para algum lado. Partilhámos uma carrinha-táxi com dois casais estrangeiros. O condutor passou  recibo para pedirmos reembolso à SATA.

Estávamos com sorte. Graças às Festas do Mar, a decorrer na Horta, havia barcos até tarde. Explicámos na bilheteira a nossa situação e o direito que tínhamos à viagem gratuita.

- Não se preocupe, senhor! Já estamos habituados aos atrasos da SATA. Não precisa de apresentar comprovativo nem de pagar. 

Recebemos os bilhetes. Dei uma volta pela Madalena: pouca gente,  muita pacatez, mesmo num sábado à noite.

Chegaram ao cais grupos de adolescentes que iam passar a noite nas festas.

Entrámos no "Gilberto Mariano". Depois de passarmos os ilhéus "Deitado" e "Em Pé", navegámos mais trinta minutos, com mar  calmo e  vento ameno, em direção ao porto da Horta. O cheiro a maresia e a algas entráva-nos pelas narinas. Atravessávamos as profundidades abissais noturnas do canal,  confortavelmente sentados, a ver as luzes em presépio da cidade da Horta a aproximarem-se do barco.  

Finalmente, chegámos! Um dia inteiro, com atrasos, voos perdidos, poucos taxistas, e a incerteza permanente de saber se o conseguiríamos ainda nesse dia. Os imprevistos fazem parte da aventura de viajar aos sítios mais distantes e isolados. E nem sequer era inverno nos Açores! Em que é habitual ocorreram  cancelamentos devido às más condições atmosféricas.

- Imaginem se vocês estivessem com o tempo contado, o incómodo que isso vos causava. Realmente, ainda estamos muito isolados! - disse-nos a nossa amiga, com um grande abraço de boas-vindas. 

Igreja da Madalena, ilha do Pico

A bordo do "Gilberto Mariano"


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