As barcas serranas desciam o
Mondego de Penacova à Figueira da Foz. Transportavam lenha, ramagem e carqueja
para os fornos das padarias de Coimbra e Figueira, regressavam com arroz
do Baixo Mondego, peixe e sal, unindo aldeias e pequenas vilas por laços económicos,
nos quais se produzia e trocava o que a
terra, o mar e o rio ofereciam. Trocas ocorridas ao longo das margens, durante centenas de anos, desde antes
de Portugal existir, quando neste território viviam tribos primitivas e, mais
tarde, povos que chegaram do Oriente com
produtos e culturas mais sofisticadas, com quem aprenderam.
Homens que remavam e velejavam entre a serra e a foz, sujeitos à força do vento e das correntes, dependentes da fertilidade da terra e do mar, testemunhas de uma diversidade paisagística que, em poucos quilómetros, passa das planuras alagadiças – de que são testemunhos os mosteiros de Santa Clara-a-Velha, abandonado devido às inundações, e Santa Clara-a-Nova, para onde se transferiram as freiras – às margens apertadas e montanhosas do interior, onde o rio corria mais impetuoso por desníveis maiores.
Enchentes reguladas com a
construção de açudes, barragens e canais,
que alteraram a imprevisibilidade da água, desviaram os seus excessos e torrentes repentinas.
Hoje, o Mondego é um rio sem as navegações de outrora. Restam a barca que fotografei, em
mau estado - a lembrar uma relíquia
arqueológica achada soterrada no fundo lodoso -, com a nota histórica e a fotografia a preto
e branco de outros tempos e, uma outra, a
jusante, ancorada na margem para passeios turísticos.
Na Praça da Lusofonia, reúnem-se em
barraquinhas animadas com música, petiscos e venda de artigos tradicionais dos
seus países, estudantes dos PALOP e de Timor-Leste, em alegre convívio. Bebem,
dançam, conversam estendidos na relva, em picnics, gozam o fim de tarde ameno, os
últimos raios de sol difusos sobre o Mondego, que desliza sereno. Centenas
de pessoas nas esplanadas, estudantes que jantam antes dos concertos no recinto
da Queima, na outra margem do rio. Subitamente, encontro um Portugal animado, colorido
e diverso. Um país agradável, estendido na relva, fruindo a vida, mostrando as
suas ligações históricas a outros países, porto seguro e acolhedor de gente de muitas
origens, fiel à sua historia e
multiculturalidade. Encontrei, em Coimbra, um país
mais tolerante e rico.
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Igreja de São Tiago |
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a lembrar uma relíquia arqueológica achada soterrada no fundo lodoso |
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