sexta-feira, 22 de março de 2013

Caminho Português de Santiago do interior (Viseu – Almargem)


1º Dia: Viseu – Abraveses – Almargem (16.7Km)


Chego ao terminal de autocarros e dirijo-me para o centro da cidade. Procuro em primeiro lugar o posto de turismo para obter mais informações sobre o Caminho Português de Santiago do Interior. A única a que tive acesso antes de iniciar a jornada foi a existente na internet, no sítio do CPSI.

Dois peregrinos falam com a funcionária e queixam-se da falta de informação.

Desejo-lhes boa caminhada e digo:

- até logo, é provável que nos voltemos a encontrar no albergue.

Dou uma volta pelo centro de Viseu, entro nos claustros e no interior da sé.

Surge-me uma questão:

“Que relação existe entre o São Teotónio e esta cidade?”. Há um braço de prata no tesouro da sé que supostamente é um modelo do verdadeiro braço do Santo.

A casa do Miradouro (onde não entrei) é um bonito edifício senhorial que alberga o museu arqueológico.

Muito haveria para visitar na cidade. Decidi por os pés na estrada e seguir caminho. Vou entusiasmado e com algumas expetativas. O caminho foi inaugurado há menos de um ano, passa por sítios pouco habituais e fora das rotas mais tradicionais e concorridas dos outros caminhos de Santiago.

“O que irei encontrar e descobrir?”

“Como será o caminho?”

“ Encontrarei muitos peregrinos?”

A experiência foi-me dizendo que o melhor é não criar muitas expetativas, é simplesmente caminhar e fruir ao máximo a liberdade de estarmos por conta própria, sem dar explicações a ninguém, apenas com o objetivo de chegar a um destino em autonomia e ter surpresas boas.

Os primeiros quilómetros são monótonos. Atravesso a periferia da cidade, caminho sempre por estrada de alcatrão, passo por vivendas, terrenos, armazéns, escolas (a EB2,3 Azeredo perdigão, em Abraveses), vivendas e prédios dispersos, sem interesse.

O caminho muda gradualmente, afasto-me da cidade e entro em estradas de terra batida e de mato. Vejo ao longe os dois peregrinos do posto de turismo. Mantenho-me afastado.

Surge uma antiga estrada Romana no meio de uma mata de pinheiros e mais à frente rebanhos de ovelhas em pequenos prados, retalhados por muros de granito.



Aproximo-me dos peregrinos. Abrando o meu ritmo e sigo com eles.

A Natália e o Vasco conheceram-se no caminho Francês e combinaram reencontrar-se para fazer este caminho até Santiago.

O percurso torna-se cada vez mais interessante, não só pela companhia e boa disposição dos meus companheiros, mas também porque a paisagem é cada vez mais bonita e começam a surgir pequenas surpresas.

Alguém faz gestos para nós, de um armazém no meio do pinhal.

- Venham cá, venham cá – chamam-nos.

- Querem ver as nossas vacas?

Um casal muito simpático com os seus três filhos, faz questão de nos mostrar as vacas do estábulo. Uma dela chama-se Cornuda é muito meiguinha, gosta de festas e põe a língua de fora. O dono encosta-se ao focinho e recebe uma lambidela na cara.

Depois mostram-nos o filho da cornuda, um vitelinho de poucas semanas que se encontra dentro do armazém.

Sempre com um sorriso na cara, despedem-se de nós e desejam-nos um bom caminho.

Atravessamos o rio Vouga em Almargem. A jornada termina algumas centenas de metros mais à frente, na Sede da Associação Recreativa que funciona como albergue temporário enquanto não terminam as obras do novo.

Os albergues não têm funcionário permanente. Deve ser feito um telefonema prévio para avisar da chegada. Foi o que fizemos, no entanto estivemos um longo tempo à espera que nos abrissem a porta.

O presidente da Junta é o primeiro a chegar e amavelmente nos esclarece e justifica o atraso. Pouco depois aparecem duas meninas, voluntárias, que colaboram com o albergue e de forma muito prestável dão-nos as informações necessárias. Cedem-nos mantas, colchões e ajudam-nos.

- Precisam de mais alguma coisa?

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Vasco está habituado a cozinhar nos albergues de Espanha e prontifica-se para fazer o jantar.

- Eu nunca comi nos albergues, não trouxe nada para cozinhar, nem talheres, nada. Como sempre fora ou fruta e sandes, quando faço os caminhos – respondo.

-Não faz mal, comes na mesma connosco. Não vale a pena estar a comer fora. Eu faço qualquer coisa.

Vou a uma mercearia comprar um pacote de massa. Preparamos o jantar no café da associação, no rés-do-chão do edifício.

O vasco cozinha massa com atum, temperada com um cubo de caldo Knorr.

A Natália faz a sopa com caldo Knorr e põe a mesa junto à lareira.

Aos poucos o café vai-se enchendo com homens que chegam para jogar cartas, ver televisão e beber um bagaço ao balcão.

O fogo da lareira é regularmente atiçado pelo Sr. Jorge, o responsável pelo café e um dos voluntários da aldeia que colabora na manutenção do albergue. Mostra-se sempre muito prestável connosco, oferece-nos uma bola tradicional de massa de milho e carne de porco, feita pela mãe.

No fim do jantar eu lavo a louça e ficamos os três a conversar à lareira, com chá, bolachas e folar de olhão.
Sé de Viseu e  Museu Grão Vasco

Claustros da Sé

Igreja da Misericórdia, Viseu

Casa do Miradouro (Séc. XVI)

Monumento a Viriato

A simpática vaca Cornuda

Estrada Romana


O Rio Vouga em Almargem

O nosso albergue e as nossas "camas"

O albergue de almargem e o futuro albergue (em construção)

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