A saída apressada/ expulsão dos
Portugueses de Angola foi caótica. Um inferno, cenário de guerra e medo
retratado no romance e em obras de repercussão internacional de conceituados
jornalistas, como “Angola, mais um dia
de vida”, de Ryszard Kapuscinsky.
Quem nunca esteve em Angola não faz ideia e os que vieram de lá parecem ter algum pudor em contar tudo o que viram e passaram. As suas experiências são arrancadas a ferros, quando começam a falar as imagens que transmitem dão um filme de ação digno Hollywood. “Tive de me esconder na banheira, era o sítio mais seguro de casa.” É pena o cinema português não ter dimensão e dinheiro para retratar a descolonização, não faltariam cenas e enredos verdadeiramente emocionantes que colariam os telespectadores aos ecrãs.
Muito ficou por dizer, sentimentos e emoções traumáticas que se quiseram esquecer. Talvez um sentimento de culpa ligado ao período colonial, a forma como os “pretos” eram tratados, condicione a expressão de quem de lá voltou, obrigue à omissão e ao silêncio. “Deixei lá tudo”, ouve-se frequentemente. Fica o ressentimento de quem “tudo perdeu”, a imagem de um país de pantanas que recebeu mas não compreendeu.
Dulce Maria Cardoso não tem papas na língua, descreve despudoradamente as relações entre brancos e negros antes da independência. A pobreza e a miséria da metrópole que levou milhares de portugueses a procurar melhores condições de vida nas colónias e a que encontram quando regressam com os seus parcos haveres. O sentimento de abandono, traição e esquecimento em relação aos políticos responsáveis pela descolonização atravessa o romance, recorrente nas expressões de desdém - o “Bochechas”, o “Rosa Coitadinho” - usadas pelos retornados.
A metrópole vivia o PREC, tempos verdadeiramente “conturbados”, referidos frequentemente por uma das personagens. DMC transmite uma imagem sensível do drama vivido por meio milhão de portugueses. Quem não veio de Angola com a descolonização tem pelo menos algum familiar, amigo ou colega de trabalho que veio.
Os retornados deram a volta,
integraram-se, melhoraram Portugal. Trouxeram uma experiência de vida e
abertura mental que não existia no país pobre e atrofiado por uma longa ditadura.
O livro termina com a mensagem
esperançosa da iniciativa e vontade de ultrapassar a adversidade.
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