sábado, 17 de abril de 2010

Trilho da Penoita














O trilho da Penoita em Vouzela tem aproximadamente 13 Km de extensão e é circular, com uma alternativa de apenas 4 Km. Começa no parque de merendas da mata com o mesmo nome, um excelente local com muita sombra e sossego.

Todo o percurso está bem sinalizado, excepto o tramo entre a aldeia de Covas e o Bicão dos Conqueiros, cuja não renovação da sinalização por parte da Câmara Municipal de Vouzela é intencional. Esta pretende apenas que seja feito o restante trajecto. Há dúvidas quanto à autenticidade do Bicão como um verdadeiro menir, ou se é apenas uma rocha colossal que lembra um menir. O Percurso fica na Serra do Caramulo. As aldeias, vegetação e fauna são as características desta zona.

Em Vouzela não podemos vir embora sem comprar alguns dos seus  doces típicos: o Pastel de Vouzela, muito parecido com o de Tentúgal, o Folar, um tipo de pão doce...

A caminhada foi organizada pela Câmara Municipal e os participantes têm direito a receber uma recordação do município e a participar no Concurso de fotografia. Para mais informações, consultar este sítio.

Aqui ficam algumas fotos.

Mata da Penoita
mata da Penoita

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Dólmen da Malhada do cambarinho

Adsamo


Em 1931 o meu avô trabalhava em Folgosa, Castro Daire, e o meio de transporte usado para a viagem era o Comboio, que vinha de Espinho até São Pedro do Sul, e depois a camioneta.

O que resta da linha, agora transformada em passeio pedonal sobre a ponte




Esta locomotiva é ainda mais antiga, terá perdurado até esse ano de 1931?






sexta-feira, 9 de abril de 2010

Oitava Etapa: Monte do Gozo - Santiago de Compostela

Distância: 4,5 Km



“O Caminho faz-se caminhando”, António Machado.


Tenho as pernas doridas, uma ferida no calcanhar esquerdo que me faz mancar pela manhã, enquanto não me habituo a caminhar, e, de vez em quando, sinto uns esticões no cóccix que me fazem parar subitamente por causa da dor.

Quero chegar cedo a Santiago. Ontem aparei a barba, recolhi os bastões e guardei toda a roupa por lavar num saco de plástico, bem no fundo da mochila, e puxei o lustro às sapatilhas com folhas de jornal para lhes retirar restos de lama e pó. Levo a minha roupa mais limpa e mais bem cheirosa. Quero entrar em Santiago de cara lavada e com bom aspecto. A cidade é muito monumental e estará repleta de turistas e de peregrinos. Quero fluir discretamente e sentir-me bem no meio de toda essa massa humana.



Levanto a credencial na Oficina do Peregrino e deixo a mochila numa consigna ao lado. Assim deambularei mais facilmente e discretamente.


Desejo cumprir todos os rituais de uma peregrinação “a Sério”. Entro na catedral e visito o túmulo do apóstolo Tiago. Sinto alguma comoção neste momento. Não consigo ser indiferente à História de milhões de peregrinos que aqui vieram ao longo de mais de mil anos, de todos os pontos da Cristandade, para estarem mais próximos dos restos mortais do apóstolo. Acreditando que esta proximidade faria um milagre nas suas vidas e que dali para a frente tudo seria melhor. Muitos deles atingindo certamente uma espécie de delírio ou êxtase místico, aqui neste sítio onde estou.


Mais tarde assisto à missa e o Bispo enumera todos os grupos de peregrinos que ali se encontram e o local de partida.

- …de ponferrada, quatro da Alemanha e um de Portugal…


Nunca gostei muito de chegar a Santiago. A cidade embora muito bonita e monumental tem demasiados turistas e o Kitsch do turismo de massas. Muita confusão nas ruas, vendedores ambulantes, comércio de produtos típicos e exploração de preços.


O mais interessante do caminho não é chegar, é fazê-lo. Cada dia é uma nova descoberta de pessoas e lugares diferentes. O que poderá ser interiormente enriquecedor são as surpresas que ele nos reserva.


Vejo aos longe dois peregrinos com que me cruzei em Palas de Rei, partilhei a mesma camarata com eles. Despedem-se emocionados um do outro. Passo por um deles, vem a tentar conter as lágrimas nos olhos.

Albergue do Monte do Go
Os Carimbos do caminho




Sétima Etapa: Arzúa - Monte do Gozo

Distância: 34.6 Km

Ontem lavei as polainas e deixei-as penduradas na corda do terraço. Esta noite choveu e de manhã, quando fui buscá-las, não estavam lá. Pensei que as tinham roubado. Procurei melhor e vi-as num estendal debaixo de um abrigo, protegidas da chuva. Alguém teve o cuidado de as mudar de lugar para não se molharem.

O caminho ia-me pregando uma partida: Todas as etapas passam no meio das cidades e aldeias. Contava parar em Pedrouzo Arca para me reabastecer de géneros e descansar um pouco. Não sei por que razão o caminho não passa no centro da cidade, faz um desvio e continua pelo meio do bosque. Quando me apercebi disso já estava bastante afastado para voltar atrás e continuei em frente sem água e com sede. Para piorar a situação, o sol, que se havia mantido encoberto até ali, começou a abrir. Andei alguns quilómetros com a sensação aflitiva de sede e não ter água potável para beber, transpirando bastante e sentindo a garganta seca. Subitamente vejo ao longe, no meio do nada, uma carrinha de bebidas. Não foi uma alucinação, foi mesmo uma carrinha de bebidas. Bebo meio litro de água com alguma sofreguidão e compro mais meio litro para me precaver.


Há muitas máquinas de bebidas ao longo do caminho Francês, afastadas das aldeias. Num desses locais, havia inclusivamente uma caixa em que se podiam comprar bonés, t-shirts e outras com sobremesas de fruta, gelatinas e iogurtes. É admirável e muito útil encontrar estes pontos de reabastecimento nos desterros.

Este ano celebra-se o Xacobeu. Significa que o dia 25 de Julho, dia de São Tiago, calha a um Domingo. Espera-se uma afluência de milhares de peregrinos a Santiago de Compustela e que o caminho Francês, o ex-libris dos caminhos, tenha uma saturação enorme de peregrinos. A Páscoa é uma época alta, as temperaturas são mais amenas do que no Verão e muita gente aproveita os feriados da Semana Santa para meter mais uns dias de férias e fazer os caminhos nesta altura.
Entro na camarata do albergue e um rapaz novo ouve música celta de um rádio. Ele desliga-o e respondo-lhe em Castelhano, que não é necessário desligar o rádio, que pode continuar com a música.

- No me molesta

Depois entra uma senhora mais velha e diz-lhe qualquer coisa em Português. Respondo aos dois subitamente:

- Vocês são os primeiros peregrinos Portugueses que encontro - e eles muito admirados a olhar para mim.

- Nós também.

São mãe e filho, do Porto. Estão a fazer o Caminho Primitivo. Começaram perto de Lugo e, até Arzúa, onde o caminho Francês e o primitivo começam a coincidir, quase não viram nenhum peregrino. Andaram isolados por aldeias muito pequenas e pobres, sem nada.

- O Caminho Francês parece uma romaria - respondo-lhes.

- Ouvimos dizer que apanharam neve.

- Sim é verdade. - e mostro-lhes na máquina digital as fotografias que tirei com neve. Eles olham-nas maravilhados, a mãe suspira.







terça-feira, 6 de abril de 2010

Sexta Etapa: Palas de Rei - Arzúa

Distância: 28,7 Km

O caminho de Santiago pode ser visto como uma metáfora da vida: é o mesmo para todos, mas ninguém o faz da mesma forma. Cada um segue-o sozinho, mesmo acompanhado tem que caminhar sozinho, ninguém o pode fazer por ele, e terminará sozinho. Cada caminhante cruza-se com muitos outros, conhece-os, fala com eles. Alguns ficarão na memória, de certa forma foram importantes e houve empatia, outros rapidamente serão esquecidos. O caminho será vivido de formas e motivações muito diversas, para uns com um motivo forte e profundo e para outros nem por isso. Haverá muita dor e sacrifício. Alguns conseguirão fazer um caminho mais longo, respeitá-lo-ão e aceitá-lo-ão mais do que os outros, chegarão ao fim mais tranquilos e satisfeitos e aprenderão muito com as Histórias do caminho.

Cruzo-me com dois irmãos Irlandeses de Dublin, Marc e Simon. Simon já esteve em Portugal:

-Lisbon is so sophisticated and fashionable.

Ambos adoram os Pasteis de Nata. Conheceram-nos numa feira gastronómica de Londres, e a partir daí andam com água na boca por estes doces. Sempre que têm oportunidade, em locais com muitos Portugueses, comem um e acompanham-no com um café dos nossos.

Simon quer conhecer Évora.

- Em Dublin, a rua onde vivo chama-se Évora Park. Nunca consegui descobrir porque tem este nome.

Mais foleiradas da TV Espanhola:

Adolfo Cubas, ex-amante de Ricky Martin, revela em entrevista os detalhes mais íntimos da sua relação com o cantor: “Quando nos encontrávamos eram dois vulcões que entravam em erupção. Ricky Martin é muito versátil.” – a televisão mostra imagens do cantor em palco com os seus trejeitos de dançarino.

Há um painel residente de comentadores que irá debater em directo a entrevista.

Volto a encontrar Luciana, tem os pés com bolhas e muito inchados no tornozelo. Enquanto vai ao posto de saúde rebentar as bolhas e tratar do inchaço, espero por ela num bar combinado para jantarmos. Folheio o jornal “A voz de Galicia”. Na primeira página uma fotografia a cores dos protestos dos habitantes de Valença do Minho com as bandeiras Espanholas desfraldadas nas varandas e lojas da cidade.

Quando chega, mostro-lhe a notícia e digo:

- Se estivesses a fazer o caminho Português e parado em Valença do Minho, não poderias ir a um posto de saúde tratar dos teus pés. Terias que apanhar um táxi ou caminhar mais uns quilómetros.

- E porque fecham os Postos de Saúde?

- Creio que por falta de dinheiro.

- Isso assim é muito mau, só vais afastar as pessoas. Como se chama o vosso Primeiro – Ministro?

- A culpa não é só dele. Isto já vem de trás. Os problemas económicos são endémicos em Portugal.

Tipica aldeia Galega com o cruzeiro de santiago


O Espírito do caminho

Albergue de Ribadiso, o mais bonito até ao momento
A minha cama para esta noite,  Arzúa

Quinta Etapa: Portomarin - Palas de Rei

Distância: 24,5 Km













Rotina de um albergue:

Chegar. Tomar banho. Pôr alguma roupa a lavar e a secar. Jantar e deitar cedo, antes das 22.00 horas, e acordar por volta das 07.00 da manhã, para abandonar o albergue antes das 08.00.

O preço habitual nos albergues públicos é de 5 € e nos privados 10€ (são ligeiramente melhores). Há poucos anos atrás não havia preço, era La Voluntad em quase todos. Com o afluxo crescente de peregrinos, resolveu-se instituir um preço, que não fez diminuir o número de peregrinos, este tem aumentado de ano para ano.

Todos têm condições dignas. Há cuidado em mantê-los limpos e asseados e, dentro das características de um albergue, consegue-se ter alguma privacidade. Excepto neste Municipal de Palas de Rei. Está muito desmazelado: não tem cortinas, quem passa na rua vê os quartos de dormir; as casas de banho são mistas e não têm cortina no chuveiro. Os tanques de lavar roupa estão cheios de lodo e cheiram a mofo.

Pela alvorada encontro os três Galegos na Plaza de Portomarin.

- Dormiram outra vez na rua?- pergunto-lhes e rir.

Estavam a fazer tempo para ir ao Posto de Saúde. Luís mostrou-me os tornozelos, estavam horríveis com uma enorme cicatriz vermelha à volta deles, pareciam uma queimadura de água a ferver. Foram as botas que lhe provocaram essas feridas. Deitou-as fora e continuou até ao fim em chinelos. Ontem terminaram a etapa muito penosamente e foi por pouco que ainda arranjaram lugar no albergue público.

- Vão continuar hoje até Palas de Rei? – Não sabem como vai ser. Desejo-lhes boa sorte e as melhoras.

Chego cedo demais a Palas de Rei. Se tivesse continuado mais uns quilómetros teria ocupado melhor o meu tempo, caminhando, e estaria mais próximo de Santiago.

Estou com dificuldades em ocupar o tempo. Tenho um livro para ler que ainda não iniciei, talvez o faça hoje.

Entretanto janto sozinho e fico ligeiramente tocado pelo álcool, numa alienação que me ajuda a passar o tempo. Este tempo morto é monótono se não houver companhia. É bastante mais agradável caminhar acompanhado do que sozinho e caminhar sozinho é melhor do que ficar em casa.

A televisão Espanhola consegue ser mais horrível do que a Portuguesa. Sempre que parei num bar e olhei para o televisor, vi mulheres histéricas a gesticular e a falar muito alto. Uma contra o pai que não reconhecia a neta e a havia maltratado em pequena; outra contra uma vizinha. Só peixeiradas ao vivo. Sem faltarem os comentadores pindéricos a dar a sua opinião, e a sua moral, sobre cada caso.

Regresso mais cedo do que o habitual ao albergue e aproveito para começar a ler o livro, talvez me seja uma boa companhia.

 
Festa da Aguardente, Portomarin...não bebi aguardente

Portomarin, 07.00horas

domingo, 4 de abril de 2010

Quarta Etapa: Samos - Portomarin

Distância: 34 Km













Já estou na Galiza. Noto uma diferença nos preços de Castilla y Leon para a Galiza, aqui são mais baratos. Acabou-se a neve e o tempo começou a melhorar gradualmente, já não uso o impermeável e percorro campos verdes, bosques com ribeiros, pequenas cachoeiras, aldeias semi-abandonadas com galinhas e esterco de vaca na rua. É a Galiza profunda de campos roliços a perderem-se na lonjura do horizonte.

Sérgio, Nestor e Luís são três rapazes Galegos com quem partilho esta manhã de caminhada.

- Se queres conhecer bem a Galiza tens de ir às suas aldeias.

São de Pontevedra e pela primeira vez estão a fazer um caminho de Santiago.

- Compramos roupa muito barata para este caminho.

No Cebreiro chegaram muito tarde ao albergue e já não havia lugar para eles, tiveram que dormir ao relento, encostadinhos uns aos outros, abrigados no alpendre de uma igreja. O pior de tudo não foi a neve nem o frio, foram as gotas de água que cairam regularmente do telhado durante toda a noite.

A nós junta-se Luciana, Brasileira do Rio de Janeiro que vive há muitos anos em Barcelona, onde trabalha como gestora num hospital. Pela primeira vez nos últimos dias estou a falar Português sem ser por telefone.

Em Sarria lanchamos juntos e depois cada qual seguiu o seu caminho ao seu ritmo. Peregrino não empata peregrino!

Em Portomarin lavo mais alguma roupa e espremo-a à mão. As lavandarias têm sido um ponto de encontro interessante para conhecer peregrinos.

Dois tipos conversam um com o outro, são Americanos e rapidamente entro na conversa.

Vivem na Holanda e são do South Dakota

- Nunca deves ter ouvido falar.
Vêm com as mulheres e as filhas adolescentes e mais alguns amigos. Um grupo numeroso que mais tarde encontro a jantar no mesmo restaurante.

Um deles diz-me para não ter pressa que a etapa de amanhã será muito bonita.

Parece que não me consigo livrar dos vícios diários de ter pressa, de ter que andar sempre a pensar em alguma coisa para fazer e que não consigo usufruir a paisagem devidamente. Penso que quanto mais cedo acabar a etapa melhor e depois no que tenho que fazer quando chegar, se vou arranjar dormida no primeiro albergue que encontrar, se vou poder lavar roupa, se vai haver onde comer ou comprar comida, se vou poder ter alguma privacidade …tem havido sempre uma preocupaçãozinha a roer-me o espírito.

- Temos que aprender a viajar. Eu ainda não aprendi – respondo-lhe.

Os momentos em que me consigo abstrair de todas as questões materiais talvez sejam os melhores de todos.


A Galiza profunda