Nyhavn |
Tive na adolescência uma Pen Pal
Dinamarquesa. Nunca tinha ido à Dinamarca. A minha Pen Pal nunca me
convidou, ficamos pela curiosidade platónica, pelas fotografias que enviávamos
um ao outro, escolhidas a dedo. As nossas melhores poses, mais sensuais e
giras. As nórdicas eram o ideal de beleza dos rapazes portugueses, habituados
às morenas e trigueiras do sul. Qualquer miúda de olhos azuis e cabelo loiro estava em vantagem sobre as outras, mesmo que fosse feia. Só por ter olhos
azuis e cabelo loiro. Enviei-lhe uma pulseira com o nome dela, Connie, feita com
fios de lã - estava na moda fazer pulseiras. Falava-lhe das minhas
rotinas, escola, disciplinas favoritas,
tempos livres. Ela fazia o mesmo, respondia às perguntas que lhe colocava sobre
o país, enviava-me postais da sua cidade – o castelo de Kolding, Koldinghus,
junto ao lago -, outras fotografias. Um dia paramos
subitamente de nos corresponder e nunca mais tive notícias da Dinamarca.
Não tenho amigos Dinamarqueses.
Faço parte do grupo de pessoas que compra a viagem aérea ao preço mais baixo
possível e faz a pesquisa no Booking dos hotéis mais baratos, de preferência perto
do centro da cidade. Escolhi Copenhaga
como podia ter escolhido Bucareste, Dublin ou Malta, desde que tenha voos diretos e seja um país europeu – pode
ser preconceito, mas sempre me senti mais à vontade e seguro em viajar dentro
da Europa. A minha experiência noutros
continentes é quase nula, aceito que
digam que é preconceito e ignorância minha, que estou a ver pelo prisma enviesado de quem conhece
pouco mundo.
Fui sem conhecer o país, sem
ninguém à espera, sem guia - um turista,
apenas, a aproveitar os low-costs e os voos diretos que as companhias aéreas
disponibilizam, como tantos outros. No entanto, orgulho-me de fazer as coisas
por conta própria, de ir sem agências, definindo o meu tempo, horários e sítios
a visitar.
Adquiri o CopenhagenCard de 72
horas e durante os três primeiros dias tentei aproveitar ao máximo os
benefícios do cartão: viagens nos transportes públicos dentro e fora da
cidade, passeios de barco nos canais,
visitas a mais de 80 atrações. Como Português, visitando outro país, fiz naturalmente
muitas comparações entre os dois países e Portugal sai a perder. É fácil viajar
dentro de Copenhaga, encontrar transportes frequentes, modernos e confortáveis
para todo o lado. A cidade foi considerada a segunda melhor do mundo em
qualidade de vida, depois de Viena. Em qualquer parte, há um jardim próximo, os
habitantes têm à sua disposição espaços verdes, cinemas – vi três perto do
hotel –, ciclovias. Faz-se desporto naturalmente no dia – a -dia e em
segurança. As mamãs transportam os filhos no berço atrelado à bicicleta, as
adolescentes deixam as bicicletas nos jardins para fazer picnics com as amigas.
Vive-se tranquilamente e com elegância – é o que parece.
Diz-se que as pessoas do Norte
são mais frias e reservadas – talvez. Em Copenhaga ninguém chateia ninguém,
desde que se faça pouco ruído e não se dê nas vistas. Fiquei com a impressão de
que não apreciam gesticular e que não devem gostar de pessoas histriónicas que
gesticulam e falam alto. Acabamos,
naturalmente, por absorver o ambiente da cidade. Inconscientemente, damos por
nós a falar baixo, quase a cochichar no meio da rua, para não fazer barulho. A
ter receio de fazer perguntas - tudo é tão organizado que fazer uma pergunta a
alguém implica mostrar ignorância. As pessoas devem pensar: “Devias ter
consultado a brochura, visto os horários, etc. Não sejas preguiçoso.” Há uma
certa fleuma no ar.
Ao início, portava-me muito
civilizadamente. No semáforo vermelho, sem carros a passar, aguardava
pacientemente o sinal verde. Não me atrevia a atravessar a estrada. Em Roma
Sê Romano, é um adágio que tento seguir fielmente em qualquer lugar: é uma
forma de me manter discreto, de passar
despercebido no meio da multidão num país estranho. Observo as pessoas com
atenção, vejo os seus gestos e comportamentos, faço como eles. Nem sempre
consigo. Mais tarde, quando comecei a ganhar confiança e a sentir-me mais
entrosado no ritmo da cidade o verdadeiro Tuga que há em mim veio ao de cima,
perdi a inibição e atravessei algumas vezes a estrada com o
sinal vermelho. Não era o único, porém.
Radhuspladsen |
Museu das Ilusões |
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