quinta-feira, 19 de agosto de 2021

Areinho - Cais de Gaia

 


 Três miúdos preparam-se para mergulhar do tabuleiro inferior da ponte D. Luís.  Chamam os turistas de forma ruidosa, batem palmas, gritam alto, exibem-se em cima do corrimão. Um colega anda na margem a recolher dinheiro para dentro do chapéu:

- Já dá para saltar, Rodrigo? – pergunta um dos colegas na ponte.

- Ainda não.

Continuam a gritar, a chamar turistas.   - Está a ficar cheio de gente, carago!  Mexe-me essas trombas,  enche-me o chapéu, pá! Aproveita que está cheio de turistas– ordenam. Os mirones, a maior parte sem perceber uma palavra, vai-se rindo dos modos deles. 

- Um turista  deu 5 €!! - grita o Rodrigo. 

- A sério?! Então vou mergulhar, que ça lixe! – Um dos colegas no tabuleiro atira-se de pés para o rio. Um salto de 20 metros, que deve ser a altura do tabuleiro inferior da ponte.

Os turistas aplaudem.

-------------------------------------------------------------------------------------------------------

Na descida ingreme para a ponte D. Luís, um indivíduo assa sardinhas na rua à entrada da sede do Clube Desportivo do Torrão. Tenta convencer os turistas:

- Very wonderful Sardines!! Sardinas muy buenas!! Quieres entrar para comer?

Quando percebe que sou português, desculpa-se. Respondo: “eu também como sardinhas como os outros!”.  Rimos os dois.

- Dê uma volta e depois regresse. São muito fresquinhas, garanto-lhe! – convenceu-me. Regressei e comi sardinhas com batatas a murro. O Sr. José faz parte do corpo social do clube e serve no restaurante,  “só para ajudar”. O homem que está no assador não é sócio do clube mas também gosta de ajudar. É ele, o Sr. José e mais outra pessoa na cozinha.

A casa vai-se compondo com mais clientes, quase todos estrangeiros. Uma tasca que contrasta  com os restaurantes elegantes e caros da ribeira,  que têm a  vista desafogada para o Porto. Fica mais escondida, mas em contrapartida tem uma localização muito original: debaixo do tabuleiro da ponte. Mais castiça e antiga do que a maioria dos restaurantes, fundada em 1958. 

---------------------------------------------------------------------------------------------------

Passo no World of Wine só para ver as vistas. É um espaço com um conceito muito inovador na cidade. Além das “melhores vistas” sobre o Porto, possui museus, restaurantes e a escola do vinho. Um local para regressar com calma, ver, provar, saborear. Pareceu-me ainda com pouco movimento para a dimensão e ambição que tem. Estou convencido que gradualmente acabará por se impor e que brevemente passará a ser um local de visita obrigatória.Tem todas as condições para isso.

-------------------------------------------------------------------------------------------------

Já se pode ir a pé do areinho de Avintes até à Afurada, ao longo do rio.   Fiz a parte entre o Areinho de Oliveira do Douro e o Cais de Gaia. O trajeto ficou completo com a inauguração em Maio de alguns troços de passadiço que faltavam.   Percurso incrível com vistas fabulosas, apanhando enquadramentos pouco habituais dos tabuleiros de ferro das pontes D. Luís e D. Maria, e de cimento das pontes do Infante e de S. João, pela encosta granítica e austera de Quebrantões.

Ao chegar à ribeira de Gaia, a vista do Porto, embora não seja uma surpresa, surpreende sempre. É um misto de orgulho sempre que observo esta panorâmica única e,  ao mesmo tempo, de frustração, porque o Porto tem beleza, história e carisma, não é inferior a muitas cidades europeias, que no entanto são mais visitadas e famosas.  Falta-lhe mais vida, população, estar menos abandonada – como diz a letra do Carlos Tê:

“Ver-te assim abandonada
Nesse timbre pardacento
Nesse teu jeito fechado
De quem mói um sentimento

Por isso, também dói observar o Porto. Há a nostalgia de uma alegria e vida que nunca existiu na cidade, mas que sabemos que podia existir.  Seguramente podia ser melhor quando comparada com outras cidades europeias que, com menos, são mais sobranceiras, opulentas e dinâmicas. 




















Sem comentários: