As ligações em autocarro são muito limitadas entre as diferentes localidades da ilha do Pico, são operadas pela empresa Cristiano (Ver
hiperligação aqui). É difícil conciliar os horários com a vontade de visitar a ilha, ver o
maior número possível de lugares e regressar no barco do mesmo dia ao Faial.
Existem apenas quatro barcos diários entre as duas ilhas (ver os
horários aqui). Contudo, é possível através da internet, a 2000 km de
distância, planear a viagem e ficar com uma ideia aproximada das limitações
locais. O que pode ser monótono retirando-lhe alguma surpresa e
imprevisibilidade.
Ao contrário de Paul Theroux, que viajou do Cairo à Cidade do
Cabo quase sempre por terra, sujeitando-se a vários perigos, à ausência de
estradas dignas desse nome, a transportes decrépitos e irregulares, a atrasos
de dias e incertezas várias, nos Açores e na Europa há uma dose de
previsibilidade e segurança bastante maior. Consegue-se planear e cumprir os objetivos da viagem dentro dos tempos estabelecidos.
A referência a Paul Theroux e neste caso ao livro Dark Star Safari, “Viagem por África”, Quetzal Editores, é abusivo, visto que se trata de um verdadeiro viajante e não de um simples turista como eu.
Tenho a veleidade de improvisar e fugir à rotina
habitual de ter tudo previamente organizado pela agência de viagens. Procuro
uma “essência” dos sítios que vou visitar, se é que ela existe, descobrir algo diferente por
conta própria, tornar a viagem mais pessoal e íntima e não apenas mais uma,
como muitas outras. Ser ingenuo ao ponto de acreditar que uma viagem nos pode transformar.
No séc. XIX o escritor Mark Twain fez escala na ilha do
Faial. Passeou de burro e observou as
mulheres de capote e capelo, ficou surpreendido com a forma como elas escondiam
o corpo, mesmo quando fazia calor, e descreveu os hábitos locais. Um relato
delicioso no livro “A Viagem dos
Inocentes”.
Mulheres de capote e capelo, fotografia retirada daqui |
António Tabucchi no livro “A Mulher
de Porto Pim” reúne vários géneros
literários. Relato estranho de uma viagem aos Açores, com prosa, ficção,
texto jornalístico e jurídico, na década de 80 do século passado, quando se caçavam baleias. “A Mulher de Porto Pim” , que dá nome ao livro, é um conto
fantasioso de amor e solidão. Outros dois escritores fascinados pelos Açores
foram Raul Brandão, que numa época em que a fotografia era um documento raro,
relatou nas “Ilhas Desconhecidas” os Açores com várias cores, tonalidades de
luz e sombra, fiel ao estilo impressionista que o caracterizou. J. Leite de
Vasconcellos descreveu a etnografia açoriana no início do século XX, no livro “Um
Mês de Sonho”.
Como tudo mudou! Hoje está na moda o Whale Watching. Os antigos barracões
onde se guardavam os botes baleeiros e as tascas, locais de encontro de
pescadores e agricultores – que também caçavam baleias: ao verem a bandeira hasteada que indicava baleia na costa, largavam de imediato os seus afazeres e corriam para os botes – foram convertidos em hostels e empresas de Whale Watching. Alugam bicicletas, organizam atividades outdoor e vendem
merchandising com cachalotes e golfinhos estampados em peças de roupa e outros
objetos.
Não existem melodias noturnas em Porto Pim a encantar os homens, nem navios de nome “Samacaio” que se afundaram nos baixos da Urzelina, nem versos cantados ao som da viola da terra sobre o destino trágico do heroico Samacaio:
Não existem melodias noturnas em Porto Pim a encantar os homens, nem navios de nome “Samacaio” que se afundaram nos baixos da Urzelina, nem versos cantados ao som da viola da terra sobre o destino trágico do heroico Samacaio:
“toda a gente, toda a
gente se salvou
Ai
se salvou, só o Samacaio não”
No Pico ainda se dançava até há pouco tempo a tradicional “Chamarrita”
e na Graciosa era comum ver homens e mulheres reunidos em tascos, bem regados
com cerveja e vinho de cheiro, a cantar melodias tradicionais, mas capazes de
fazer um silêncio solene e profundo para escutar o poeta da ilha, Zé Berto, a declamar um
dos seus poemas.
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Isolamento
Posso testemunhar por experiência
própria os efeitos das condições atmosféricas adversas na vida Açoriana. O
avião começou a sobrevoar a ilha de São Miguel, escondida debaixo de um
nevoeiro cerrado, chuva intensa e probabilidade de trovoada. Os passageiros
estavam tensos e assustados com a turbulência do voo e os poços de ar, embora
tentassem disfarçar. Por vezes o avião lembrava uma montanha russa. Sobrevoou a
pista mais de uma vez à procura de uma abertura e acalmia no vento para
aterrar, tentou uma última vez. Subitamente o piloto infletiu a aproximação e o
avião começou a subir rapidamente para regressar a Lisboa.
Os passageiros tiveram que ser
reencaminhados para outros voos, passar mais umas horas na fila à espera de
serem atendidos no balcão da SATA. Havia crianças e idosos, animais enjaulados
que tiveram que continuar presos mais algumas horas. São comuns os
cancelamentos e desvio de voos devido ao mau tempo, os passageiros ficarem
retidos noutros aeroportos, sem poder regressar a casa e ter que suportar
situações muito fatigantes.
Na tarde seguinte, quinze horas mais tarde e sem dormir, regressei
aos Açores, já sob condições atmosféricas totalmente diferentes, mais
aprazíveis, com o sol a despontar por cima das nuvens brancas e o mar azul
prateado lá em baixo. Comecei por ver a ilha Terceira e o ilhéu das Cabras,
depois o recorte nítido do Monte Brasil e Angra do Heroísmo. Mais à frente o
verde carregado em São Jorge e as fajãs da costa norte, as vinhas do Pico e por
fim o Faial, o meu destino final.
Ilha Terceira |
Ilha de São Jorge |
Ilha do Pico |
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