Nunca no Porto, ou em qualquer
outra cidade com metro eu me lembro de ir assim. A carruagem completamente
apinhada. Os passageiros como sardinhas enlatadas sob o calor, de corpos
encostados uns aos outros, sem qualquer privacidade, transpirando. O ar doentio
e empastado da carruagem fechada, sem ventilação. Uma estufa para a qual eu não
estava preparado.
A criança indefesa agarrada ao pilar,
protegida pela avô idosa, frágil e pequena, fazendo barreira com o corpo e braços para salvaguardá-la dos arranques e solavancos súbitos que
desequilibram os passageiros, podendo
cair sobre ela. Jovens turistas
italianos de manga caviada, estudantes de Erasmus, barulhentos, dizendo na
língua deles, mais não, mais não, sempre que o metro para numa estação,
torcendo para mais ninguém entrar.
Nenhum segurança nas plataformas a
organizar as entradas e saídas. Os passageiros entregues à sua sorte,
desconfortáveis. Os únicos que vejo, ainda a viagem segue tranquila, verificam
os bilhetes para sacar a multa. Não
fazem mais nada a não ser isso. Deambulam pelas plataformas a olhar o
telemóvel, sem esclarecer dúvidas, sem retirar os recibos que se acumulam nas bocas das maquinas.
Imprestáveis.
Quando a porta abre respira-se um
pouco melhor, ouve-se um ahhh de alívio
pelo ar que entra. A porta da carruagem fecha e
volta a abrir, corpos, braços e
pernas impedem-na de correr. É preciso reajustar o espaço. Os corpos voltam-se a mexer, a
comprimirem-se mais um pouco, encaixando-se novamente para a porta elétrica fechar.
Uma mulher tira o leque e abana-se com ele. Observo o mapa da linha, conto as
paragens que faltam, oito. É muito tempo!
A comparação não tem fundamento,
mas penso no horror dos vagões a transportarem
judeus para Auschwitz. Olho o chão, foco-me, o quão horrível seria
alguém vomitar ou sentir-se mal no meio desta confusão.
Pensei que o regresso seria mais
tranquilo. Entramos na primeira estação, apanhamos lugares livres. Logo depois,
em Matosinhos Sul, chegam dezenas de adolescentes vindos da praia. Telemóveis a
bombar música latino-americana, martelinhos, bum, bum, bum. Calções, Chinelos,
bikinis. Na plataforma, ainda antes de entrarem, escondem a bola de um dos miúdos, obrigando-o a
procurá-la. Continuam a brincadeira dentro da carruagem, mandando a bola ao ar.
De repente, a carruagem fica apinhada, volta o mesmo sufoco. Assisto sentado.
Os passageiros mais idosos seguem resignados, incapazes, ou com medo de repreender
os adolescentes, de mandá-los calar, de baixarem o volume. Os miúdos histéricos
cantarolam. Fazem roda e no meio dela uma miúda meneia as ancas, como se
estivesse no sambódromo, feliz. A viagem segue ruidosa, apertada.
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