Painel na estação de Águeda |
A fachada da estação de Águeda foi pintada e remodelada. Recuperada por fora, sem serviços, bilheteiras,
horários, guichets informativos, por dentro. Apenas a tabela com os horários colada na
parede do hall de entrada vazio. A espera faz-se nos bancos da plataforma de
cimento que separa as duas únicas linhas. As placas penduradas indicam
os números 1 e 2.
Os passageiros distribuem-se pelos bancos, aguardando pacientemente a
chegada da locomotiva, agarrados ao telemóvel. Gente de todas as idades: o
casal idoso segura o carrinho das compras; a mulatinha elegante parece uma manequim, de longas tranças com
missangas; o casal novo de mãos dadas; a Venezuelana que vai trabalhar na caixa
de supermercado em Aveiro; dois negros obesos.
O silvo distante da locomotiva soa ao longe. Ela surge
após a curva, vinda de Sernada do Vouga. Duas carruagens
quase vazias, grafitadas, desconfortáveis
e frias no interior. Sempre as mesmas, nada melhorou em 30 anos, só
piorou. Foram encerrados apeadeiros, encurtada a extensão, reduzidos os horários.
A mesma pobreza e atavismo. A mesma pasmaceira e lentidão.
Ouve-se o trim trim trim do sinal vermelho e da catraca fechada na passagem de nível de Casal do Álvaro. Os carros fazem fila na estrada. A fiscal acena a bandeirinha vermelha junto à cabine de cimento avisando o maquinista que pode continuar, não há objetos estranhos sobre os carris, viaturas ou pessoas a circular. Tudo seguro. A carruagem dá solavancos, parece que se vai desconjuntar toda; chiam os discos dos travões. Sente-se a trepidação do andamento. O banco é duro. Uma viagem destas, mais demorada, dá cabo da coluna. Ninguém se incomoda. O casal, do outro lado da coxia, namora e beija-se; os mais idosos agarram-se ao banco da frente absortos nos seus pensamentos; o negro gordo fala sozinho. A mulata gira na outra extremidade viaja virada para mim.
O cobrador entra na estação de Eirol: "Ora muito bom dia." Fato cinzento da CP, magro, cabelo grisalho para o comprido, barba de três dias, ar de quem quer chegar à reforma o mais cedo possível. Prende a máquina de impressão dos bilhetes no corrimão metálico na entrada do vagão, pergunta aos passageiros a origem e o destino da viagem. Aponta no telemóvel. Imprime os bilhetes. Entrega-os: 2,20€ pelo bilhete simples entre Águeda e Aveiro. O comboio para em São João de Loure. Ele coloca-se do lado de fora no degrau da porta, estica a cabeça na direção da locomotiva, faz sinal com o braço ao maquinista para arrancar.
O comboio atravessa terrenos arados, lugarejos pequenos de vivendas rústicas a necessitarem de restauro e vivendas modernas ajardinadas de painéis solares nos telhados. Quintais, pomares, planícies alagadas nas margens da pateira de Fermentelos e nos canais da ria. Abranda, entra na estação de Aveiro. Os Alfa pendulares, Regionais, Intercidades, novinhos em folha, de chapas reluzentes e cores vivas, contrastam com a velha e lenta Vouguinha. A estação é demasiado moderna para acolher uma locomotiva tão decrépita, resquício de uma linha em desaparecimento - a linha do Vouga. Ela fica discretamente parada na última linha, a mais distante do terminal central, aguardando o regresso a Sernada. Longe do rebuliço das centenas de passageiros e turistas apinhados nas bilheteiras, lojas e cafetaria do rés -do-chão. Esquecida.
Centro de Águeda |
Centro de Águeda |
Estação de Comboios de Águeda |
Aveiro |
Aveiro |
Capela de Nossa Senhora das Febres, Aveiro |
Sem comentários:
Enviar um comentário