Mais uma caminhada da ADALE. Saída da praça Velásquez às 7h 30 em direção ao Soajo. A camioneta não vai totalmente cheia. A maior parte dos companheiros são professores na reforma e outros com muitos anos de serviço, na casa dos cinquenta e sessenta. Sou o segundo mais novo, atrás de mim só um ex- aluno do Jorge Ferreira, há quase trinta anos.
A camioneta deixou-nos no centro do Soajo, junto à estátua de pedra que homenageia o cão sabujo - raça que eu desconhecia. Importante no passado: daqui eram enviados anualmente "cinco valentes cães" para os reis de Portugal, por esta razão os soajeiros beneficiaram de isenção de impostos e de outros privilegios concedidos no tempo da monarquia. Outro monumento homenageia um episódio que deu boa fama aos juízes da terra:
"Juiz do Soajo, cadeira em que se sentou, nunca consigo a levou" - e os heróis da guerra da restauração.
Vejo roulotes de matrículas estrangeiras estacionadas no largo, alguns turistas e percursos pedestres sinalizados. Percebo que estou numa terra com história e motivos de interesse, para além da beleza natural que a envolve.
Descemos ao ex-libris, capa de revistas turísticas do alto Minho e nacionais: o conjunto dos espigueiros tradicionais. Percorremos a eira sobre a rocha granítica e não foi fácil encontrar um ângulo sem pessoas para fotografá-los.
Na padaria de outra rua comprei uma fatia de pão-de-ló do Soajo para conhecer mais este doce tradicional, estava saboroso e fresco. Bastante delicioso. Ficou aprovado!
O Jorge Ferreira sobe os degraus do pelourinho e dá-nos a conhecer um pouco da história do extinto concelho do Soajo. No ensaio "Ibéria Esvaziada", Carlos Taibo considera que estamos na eminência do colapso económico, neste cenário muitos optarão pelo retorno às pequenas comunidades descentralizadas, autónomas e autossuficientes. O Soajo esteve séculos isolado do mundo, rodeado de serras difíceis de transpor, desenvolveram-se fortes traços comunais que deixaram a sua marca na cultura local e no espírito das pessoas mais velhas que viveram sempre aqui. Gostei de ver as idosas com o cajado e o lenço na cabeça. Não as fotografei, seria mais um a intrometer-se e a assedia-las. Devem estar fartas de ser fotografadas por turistas de fim-de-semana como eu. Alguns companheiros meteram conversa com elas, mostraram-se solicitas e contentes por poderem falar de si. Se Paul Theroux estivesse aqui talvez escrevesse um livro de viagens com as suas histórias.
Seguimos em direção ao rio Lima, atravessamos a ponte romana e fomos pela margem direita até ao lugar de Ermelo. Possui uma bela igreja românica restaurada, com a rosácea um pouco escondida pela aresta do telhado. Lá dentro a curiosa estatueta do São Bento: tem cartolinha na cabeça e fisionomia de criança. Contrasta com as representações austeras e sofridas de muitos santos. Este é inocente, naive, pueril.
Passamos debaixo de um frondoso carvalhal por uma calçada de muros cobertos de musgo, o troço genuinamente mais natural do percurso, inalterado há centenas de anos. Do nosso lado esquerdo o rio Lima forma um extenso corpo de água, devido à barragem de Touvedo, a jusante.
Uma parte do trilho segue pela ecovia.
Por fim, paramos para o pic-nic no parque de merendas da capela de São João. Dispersamos-nos pelas mesas. Partilhamos frango de churrasco, bolinhos de bacalhau, empadas de atum e de frango, azeitonas, rissóis, uvas americanas apanhadas esta manhã, pão-de-ló, laranja descascada para desenjoar. Outras mesas oferecem-nos vinho, salada de bacalhau, pizza, bolo e doces para a sobremesa. Duas vacas cachenas observam-nos do prado.
Depois descansamos, vamos ao miradouro, vemos o rio, a serra amarela, as localidades de Ermida e de Entre-ambos-os-rios. Silêncio. Sol. Tranquilidade. O cheiro da hortelã que os nossos pés foram pisando segue-nos desde o início do caminho, misturado agora com o da bosta ressequida na terra.
No regresso, dentro da camioneta, duas companheiras cantam melodias simples, apenas as suas vozes afinadas e a vontade de cantar, indolentemente, maravilhosamente. Começo a fechar os olhos de sono. O mais simples é o mais belo.
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