Esposende – Viana do Castelo (cerca de 27 Km)
Manhã tranquila, sem chuva.
Esposende é uma vila pacata e bonita, ruas pedonais asseadas, estátuas a
homenagear as pessoas e profissões da terra; placas na entrada dos monumentos que informam a sua origem e história. Do outro lado do rio ficam as dunas de Fão e a restinga da foz do Cávado
Esposende |
Igreja Matriz de Esposende |
Monumento ao Homem do Mar (Séc. XX) |
Restinga do Cávado |
Forte de São João Baptista (Séc. XVII/XVIII) |
O trajeto segue até à Praia Suave
Mar - pessoas de várias idades fazem jogging bem agasalhadas ao longo da ecovia, outras caminham no areal, um cão esgaravata a areia -, afasta-se do mar e segue paralelo
a ele por estradas calcetadas de granito, quintas, vivendas, quintais,
cameleiras em flor, oliveiras, árvores carregadas de limões e tangerinas.
No átrio do albergue de Marinhas
uma seta indica 26 Km para Viana do Castelo. Um placard anuncia o núcleo
museológico da Abelheira.
Estou rendido ao caminho. A
sinalização é impecável, as localidades estão vocacionadas para receber
peregrinos: várias mercearias e cafés anunciam o Menu do Peregrino e Carimbos
na Credencial, algumas em Inglês: “Stamps Here”. Percebo que é muito antigo
pelos cruzeiros e pequenas ermidas ao longo dele.
Lerei mais à frente, em Castelo
do Neiva, que a igreja local é “o mais
antigo templo consagrado a Santiago, fora do território Espanhol”,
sagrada em 862, coeva das descobertas das relíquias do santo. No entanto, vou ouvindo os passarinhos, passo por
ruas quase sem ninguém, um ou outro idoso no quintal ou à janela a espreitar,
entre o azul do mar e a encosta da serra com ermidas lá no alto. Tudo tranquilo.
As margens do rio Neiva são muito arborizadas e
algo abruptas, com musgo nas pedras escorregadias e lama, é necessário cuidado.
O som da água a correr sobre pequenos açudes e cascatas é relaxante.
Albergue das Marinhas. |
Nesta anta foram colocados seixos pintados à mão, com frases de boa sorte, desejos, fotografias e fitas deixados por peregrinos de várias partes do mundo. |
O rio Neiva entre a vegetação |
Travessia do rio Neiva e entrada no concelho de Viana do Castelo |
Encontro o Sr. Fernando a plantar
eucaliptos no meio do bosque, meto-me com ele:
- Isso é muito mau para os incêndios.
- Não vou tirar proveito deles, já
estou velho, são para o meu filho.
- Por que não planta sobreiros?
- Trabalhei no Alentejo, há lá um
ditado que diz:” O sobreiro dá o avô ao neto”, cresce muito devagar. O eucalipto
cresce mais depressa.
- Mas a madeira do eucalipto arde
muito rápido, a do sobreiro é mais lenta e mais cara.
- Não se pode cortar sobreiros – conclui
o Sr. Fernando. Eu calo-me. Um desconhecido que surge de repente no meio do
nada, é melhor não fazer mais perguntas.
Mas o sr. Fernando continua a
falar, sento-me no meco de granito a ouvi-lo e a beber chá da garrafa térmica: os terrenos em volta foram todos comprados por
um tio avô que ganhou a lotaria no Brasil; as burocracias paroquias que
envolvem a comissão fabriqueira e a construção de um albergue de peregrinos; o
filho que está no Canadá.
Sigo pelo meio do bosque que nem
um Capuchinho Vermelho, de repente surge a fachada barroca de um mosteiro entre
as copas dos pinheiros. Á frente do antigo mosteiro Beneditino, uma escadaria
ingreme até à ermida da Sra. do Crasto. Deixo a mochila cá em baixo e subo os
degraus até lá acima, dos dois lados vários painéis de azulejo representam o
calvário de Jesus Cristo. Subir a escadaria também é um pequeno calvário depois
de todos os quilómetros percorridos a pé desde ontem.
Atravesso as freguesias de Castelo
do Neiva, São Romão do Neiva e Vila Nova da Anha, onde, num cruzamento rodeado de
arvoredo, um memorial relembra o assassinato do Sr. João Pereira de Saraiva, da
freguesia da Apúlia, às mãos dos ladrões, no ano de 1836: imaginei um senhor montado no seu cavalo a ser
surpreendido neste sítio isolado por bandidos. O ambiente de um conto de Camilo
Castelo Branco, que tão bem retratou esta região de Portugal no século XIX.
O trajeto de hoje é mais ingreme,
irregular e fisicamente mais exigente. Chego a Darque por uma estrada que
atravessa o mato. Num local mais escondido, um carro estacionado com uma fulana
a ler uma revista.
E, agora, o Capuchinho Vermelho pergunta: Por
que razão está esta senhora neste sítio isolado a ler a revista dentro do
carro? E é simpática, está a sorrir para mim.
Sigo pela N13: trânsito, barulho.
Estou menos à vontade. Os carros não param na passadeira antes da ponte de
ferro sobre o rio Lima. As vias laterais pedonais são muito estreitas, é desagradável
caminhar nos acessos e na ponte.
Um dos critérios para medir a qualidade
de vida de uma cidade deve ser o conforto e a segurança dos peões. Neste aspeto,
o acesso a Viana, para quem vem por Darque, está muito aquém.
Fico na Pousada da Juventude de Viana do Castelo. O site das pousadas da juventude de
Portugal está aqui. Não sou sócio, além dos 13€ pela dormida numa camarata
com quatro camas, pago mais 2,5€ pela aquisição do cartão das pousadas da
juventude, sem o qual não posso pernoitar. Exceção feita a quem possui a Credencial
do Peregrino. O pequeno almoço está incluído no preço.
Estou com sorte, a receção colocou-me numa camarata sem mais
ninguém, com vista para o rio Lima. Um
grupo de crianças e adolescentes de Guimarães está na pousada.
Vou jantar ao snack-bar restaurante Viana Remo por sugestão
da rececionista. Caminho ao longo da
margem do Lima. É noite, não se vê ninguém.
Tudo silencioso. As luzes fosforescentes dos candeeiros do jardim e do outro
lado do rio. O snack está quase vazio. Na TVI passa um concurso qualquer com a Cristina
Ferreira, ouço os seus risinhos estridentes enquanto tento anotar as impressões
da caminhada.
Igreja de Santiago (Castelo do Neiva) "O mais antigo templo consagrado a Santiago, fora do território Espanhol". |
Obra muito interessante. O recorte das letras no metal deixa passar a luz e lê-se o texto na sombra. |
Painel de azulejo na subida para a Sra. do Crasto |
Caminho da Rebadeira (Vila Nova de Anha) |
Vila Nova de Anha |
A ponte de ferro para Viana. No tabuleiro inferior passa a linha férrea, no superior a nacional 13. |
Rio Lima |
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