Nas paredes da igreja de Santa Ana e São Joaquim estão expostos quadros de Santos, dois deles pintados por Francisco Goya. Entramos, principalmente, para os ver. De fundo sombrio, cores esbatidas, faces realçadas pelo halo luminoso, ao estilo do autor. A igreja é arquitetonicamente modesta, pequena e despojada, pouco interessante numa cidade com muito mais para ver.
A Plaza de Zorrilla tem uma certa imponência, conferida pela fachada do museu da cavalaria, contígua a um dos lados. No pórtico, o mote:
"Todo Por La Patria."
As torres simétricas parecem duas sentinelas vigiando a praça. Sente-se a exaltação da guerra e o orgulho militar. Valladolid é a capital da região de Castilla-y-Leon, berço da expansão espanhola na Europa e no mundo, apoiada pelo fervor religioso dos reis e imperadores católicos, muito homenageados na toponímia local.
A Igreja, o Estado e o Exército: a trilogia que fez a história do império e continua a marcar o carácter cultural do país.
O mosteiro dos Agostinhos Filipinos, do outro lado do Campo Grande, é igualmente imponente. Alberga o Museu do Oriente (não é só Lisboa que tem o seu).
Da praça pública partem avenidas retilíneas e largas. Os portões abertos do jardim do Campo Grande mostram uma alameda arborizada que o atravessa, cenário idílico e aprazível no meio da cidade. Lá dentro, um lago com um barco a remos, patinhos, faisões deambulando pela relva, aves engaioladas, sombras, bancos de madeira. Famílias com crianças.
Em direção à Plaza de España encontramos a Casa de Cervantes, habitação alugada pelo escritor no início do século XVII, para si, as duas irmãs, a filha, a sobrinha e a criada, um homem entre cinco mulheres. Aqui preparou a edição da sua monumental obra, D. Quixote de la Mancha. Nas paredes, citações de outros grandes escritores sobre o livro e a personagem. As aventuras do cavaleiro da triste figura continuam a comover leitores de todo o mundo. Livro genial que faz rir, sonhar, chorar. Não pensem que é um livro maçudo, apesar das seus dois volumes de 700 páginas cada, na tradução do Aquilino Ribeiro. As descrições são muito visuais e cinematográficas. As onomatopeias descrevem os ruídos nas abundantes cenas de pancadaria em que o herói constantemente se envolve.
Pela hora do almoço seguimos em direção à catedral, as esplanadas estavam repletas de gente a tapear con su copa de vino en la mesa. Em Roma sê romano e nós fizemos a mesma coisa. Sentamo-nos numa esplanada da plaza Mayor, comendo pinchos e bocadillos, acompanhados com vinho branco de Valduero.
Reparamos num fulano segurando na mão um guarda-chuva vermelho, fechado, junto da estátua de Pedro Ansúrez e algumas pessoas com ele. Era uma visita guiada à cidade. Um free walking tour, em Castelhano, que estava a começar. Perguntei se nos podíamos juntar. Sim. Apontou o meu nome no telemóvel e nas duas horas seguintes acompanhamos o grupo por algumas ruas e locais históricos. Entendi pouca coisa, o jovem guia falava muito rápido e não criava empatia. Os espanhóis que o acompanhavam não pareciam particularmente entusiasmados, mesmo quando comentava um facto mais curioso e divertido que os fazia rir e que a mim escapava o sentido. Descreveu-nos a história da Fonte de Agua Dorada, do Passeo de Gutierrez (com as suas galerias chiques ao estilo de Milão), da calle serpe (de serpente), pôs - nos a olhar para o chão, a ver a estilização do réptil com 30 metros de comprimento.
Paramos em algumas igrejas e conventos.
Entramos no palácio de Pimentel, onde nasceu o rei D. Felipe II. No átrio, os painéis coloridos de azulejo retratam episódios da sua vida, idênticos aos da estação de São Bento no Porto, contudo num local mais discreto. O guia comparou-os aos de "Oporto".
Terminamos no museu nacional de escultura a observar detalhes do gótico tardio na moldura do portão.
Quem seriam aqueles três homens barbudos: estariam nus e seriam homens selvagens muito peludos,
Ou aqueles pelos seriam apenas as malhas finas metálicas dos gibões que vestiam?
A mim, pareciam-me pijamas.
Por recomendação do guia, visitamos o museu. Algumas vezes ouvi-o dizer “é um Garcia Fernandez“, “um Berruguete", "um Juni", referindo-se a escultores famosos de santos.
O Museu é rico em estatuária e pintura religiosa medieval, renascentista e barroca. São profusos os detalhes e o realismo com que foram trabalhados os corpos dos santos, o relevo dos músculos, o esgar de sofrimento na cara. Fiquei impressionado. Valeu a pena a visita, ainda por cima gratuita por ser sábado.
Depois disso fomos para a iglesia de Santa Ana e São Joaquim assistir à procissão da confraria. As mulheres vestidas de preto com lenço e mantilha, geralmente elegantes, muito espanholitas Os miúdos com a batina e o incenseiro espalhando o fumo e o cheiro nas ruas. Os confrades com o capirote. Música solene, "Miserere Mei, Deus", de Allegri. A escultura de Cristo deitado no leito da morte.
Vimos outra procissão noutra zona, mais intensa ainda. Pela primeira vez, assistimos ao transporte do andor, que pesa centenas de quilos, nos ombros de dezenas de homens. Baloiçava de um lado para o outro com o movimento e o esforço dos confrades, dando mais dramatismo ao momento.
Do sagrado passamos ao profano. Tinham-nos recomendado a taperia "La tasquita". Sempre que passávamos na entrada víamos fila, desta vez era mais pequena e resolvemos arriscar. Esperamos pouco tempo e de facto as tapas que comemos eram muito saborosas. Não apontei os nomes.
Considero que não é caro comer em Espanha, se formos num modo mais informal, sem estar a pensar "à Português" e em ter uma refeição completa, à moda de Portugal. Assim seria caro. Escolhendo tapas variadas, partilhadas pelo grupo, pode-se comer bem sem pagar muito.
As pinturas de Goya no painel informativo |
Museu de La Caballeria |
Paragem de autobus |
Campo Grande |
Exterior da Casa de Cervantes |
Pátio interior da casa |
Catedral, da rua Cascajares |
Museu Nacional de Escultura |
Plaza de Zorrilla e Museu de la Caballeria |
Museu Nacional de Escultura |
"a mim, pareciam-me pijamas..." |
Palácio de Pimentel |
Estátua de Cervantes, universidade de Valladolid |
Catedral |
Estátua de Pedro Ansúrez, fundador da cidade. Plaza Mayor |
Sem comentários:
Enviar um comentário