O site de Câmara Municipal de Bragança tem uma entrada de itinerários turísticos, contudo eu não sabia se estão todos sinalizados como trilhos pedestres. O percurso de Alfaião, sim. O de Castro de Avelãs, talvez. Na página, todas as sugestões têm uma breve descrição e um mapa.
Fui ao posto de turismo para esclarecer a questão. Estava indeciso entre o Percurso de Alfaião e o Castro de Avelãs, ambos ficam a poucos quilómetros.
- O Castro de Avelãs fica mais próximo, faça esse.
- E está sinalizado?
- Acho que sim…
Também me foi recomendado o percurso verde do Fervença, caso optasse por ficar na cidade.
- Comece aqui – foi-me apontado um ponto no mapa da cidade, junto ao rio – e termine aqui, na ponte do Jorge. Depois suba ao Castelo. Pode também visitar o museu ibérico da máscara e do traje e o museu Abade de Baçal. Dê uma volta pela cidade e se quiser almoçar vá a Gimonde.
Foram-me indicados os nomes de uma série de restaurantes, cuja especialidade é a Posta à Mirandesa.
- E depois vá gastar as energias no Castro de Avelãs.
Fui direto ao Castro de Avelãs, deixei o carro junto ao parque de merendas, à entrada da aldeia.
Um pequeno riacho atravessa o local. Foi uma surpresa avistar cegonhas pousadas nos prados adjacentes.
Do parque de merendas vê-se o mosteiro do Castro. Fui andando a tentar descobrir indicações de algum PR.
O caminho de Santiago passa aqui. Há setas amarelas e vieiras bem desenhadas nas paredes da aldeia. Em relação a um percurso circular, com 9 km de extensão, nível fácil, de acordo com a página da Câmara de Bragança, não vi nada.
Nestes casos o melhor é falar com as pessoas das aldeias para esclarecer estas questões.
Convém também dizer a razão de ali estarmos. Não é muito habitual ver estranhos a deambular sozinhos. As pessoas olham com natural curiosidade, querem saber o que andamos a fazer, para onde vamos, de onde vimos. Por uma questão de delicadeza e diplomacia, e também por me ser útil, fui abordando as pessoas, idosas quase todas.
- Bom Dia, pode-me dizer se existe algum caminho sinalizado que eu possa fazer sozinho. Não conheço isto, preciso de orientações.
- De vez em quando vêm grupos de pessoas que sobem aí para cima, para os montes. Mas não sei que caminhos fazem. Olhe, não vá para o monte, senão ainda se perde, siga a estrada e regresse à aldeia.
Conselho útil e que me convenceu que não existe sinalização de PR em Castro de Avelãs.
As indicações da CM são sugestões de caminhadas por locais do concelho, alguns são de facto PR outros não. Os mapas do site são cartas militares. Quem realizar alguns destes percursos convém ter a carta militar/mapa e os habituais instrumentos , bússola, GPS, muito úteis nestes casos.
Não estava preparado. Quando faço caminhadas limito-me a maior parte das vezes a fazer PR, pouco me aventuro fora disso, a não ser que esteja acompanhado por pessoas que conheçam os locais ou tenham instrumentos de orientação.
O Mosteiro de Castro de Avelãs foi, durante a idade Média, o mais importante mosteiro Beneditino de Trás-os – Montes. Extinto em meados do século dezasseis. Hoje, persistem uma nave e os restos de uma estrutura arquitetónica que sofreu muitas alterações ao longo dos tempos. No exterior do templo observa-se um túmulo granítico, do século treze.
Será este o túmulo do misterioso conde de Ariães? Cavaleiro histórico e lendário, com várias referências na toponímia da região.
Segui a minha intuição, fui por uma estrada de terra batida por onde passa o caminho de Santiago e fiz novamente a pergunta a um senhor que encontrei:
- Sabe-me dizer se existe algum caminho sinalizado de pequena rota. É que na Câmara Municipal dão a indicação de um caminho circular de nove quilómetros, que começa no Castro de Avelãs e passa por uma igreja de Fontes.
- Fontes? Se quer ir a Fontes, siga até à estrada nacional, ande 2 Km até Grandais. Vire à esquerda para Fontes, atravesse a aldeia e no fim vire à esquerda. Apanhe a estrada de terra batida até ao castro. Aí sim, é capaz de fazer 9 Km e tem muita coisa bonita para ver.
As pessoas são sempre muito simpáticas e mostram-se disponíveis para ajudar quando as abordamos.
Fazendo perguntas a quem fui encontrando, improvisei e realizei um percurso pedestre semelhante ao descrito no sítio da Câmara Municipal. Caminhei pela estrada nacional 103, ao longo da ribeira de Fervença, entrei no parque de natural de Montesinho, junto a Grandais, atravessei as aldeias de Fontes e Formil, fiz alguns troços em caminhos de terra entre pomares, vinhas e olivais. Passei por carvalhais vetustos, com troncos cheios de líquenes. Vi casas bonitas, recuperadas com traça tradicional, outras abandonadas. Mais casas do que pessoas em cada aldeia que atravessei, vazias e fechadas. Por vezes querendo encontrar com quem falar não havia ninguém, mandei parar um carro num caminho de terra batida.
- Desculpe, este caminho vai dar ao Castro de Avelãs?
Um dia com um sol magnífico, os ares límpidos da serra. Ao longe os topos das montanhas da região de Sanabria, já no lado espanhol, cobertos de neve.
Em Formil, paro no café Outeiro para descansar e beber um chá. Converso com os donos, que demonstram curiosidade por mim. Digo de onde sou, o que ando a fazer, quando cheguei a Bragança e quando vou embora. Falamos do abandono da região, do túnel do Marão, das portagens.
Lanço a minha teoria:
- Acho que estão a fazer de propósito. Querem esvaziar a região, para depois vender tudo ao desbarato. Vocês têm um mel maravilhoso, vinho, azeite, frutas, cogumelos … podia ser uma região com muita procura turística. Há muita qualidade. Com os preços da gasolina e com as portagens que vão colocar, vai ser cada vez mais difícil vir para cá. Encerraram as linhas de comboio…
- Era um percurso muito bonito que se fazia pela linha do Tua – diz-me a senhora – estamos cada vez mais abandonados. Fizemos abaixo-assinados, petições para não colocar portagens, mas não adiantou nada – conclui com toda a calma e resignação do mundo.
O IP4 está a ser substituído gradualmente por um troço mais largo, com mais vias e rails, para ser transformado em autoestrada. Trás – Montes vai deixar de ter uma estrada gratuita, de qualidade, suficiente para as necessidades de uma região com cada vez com menos habitantes, para ter como alternativa uma via larga, rápida mas cara e vazia.
As obras não estão concluídas, no entanto já começou a ser portajada uma das entradas em Bragança. A ganância das corporações e das parcerias público privadas não tem limites.
Os donos do café dão-me mais uma indicação de como chegar mais depressa ao Castro de Avelãs e despeço-me deles.
Chego e entro no mosteiro. Decorre uma via sacra, um padre jovem, com cara de miudo, reza em frente de uma tela. Um grupo de senhoras idosas reza com ele. Observam o estranho que entrou na igreja durante as orações. Tiro o boné e benzo-me para mostrar deferência com o momento, saio para fora.
Formil, três da tarde |
Mosteiro de são Salvador de Castro de Avelãs |
Sem comentários:
Enviar um comentário